Um dos grandes desafios com que se estão a confrontar as democracias modernas é a necessidade de assegurar uma participação equitativa de todos os cidadãos, sem discriminações em função da sua origem.
Sendo as nações cada vez mais sociedades cosmopolitas, o que está em causa neste caso é o que se tem qualificado como origem racial ou étnica.
Assistimos hoje à emergência de cidadãos de origem africana ou mestiça nos Estados Unidos, com a candidatura presidencial de Barack Obama. Uma candidatura que irá inspirar uma emergência, mais significativa de cidadãos negros ou mestiços na actividade política. Não é por acaso, que Sarkozy, um político de direita, teve o cuidado de integrar no seu governo, Rachid Dati, de origem magrebina e Rama Yade, de origem senegalesa, como anteriormente tinha feito Bush relativamente a Condolezza Rice.
A esquerda socialista e democrática pode dizer que se trata de manipulação política ou de oportunismo, mas todos os que se colocam à esquerda da indiferença com que uma grande parte da esquerda encara estas questões, não se podem resignar à falta de sensibilidade e de imaginação que a nossa área política tem manifestado nesta matéria nos últimos anos.
A revista “ÚNICA” do Expresso de 29 de Março de 2008 publica uma reportagem de Christiana Martins, sobre o que designa “Elite à prova de racismo”, dando a palavra a cidadãos portugueses de diferentes origens. Independentemente de uma ou outra imprecisão, trata-se de um trabalho oportuno e importante que procura avaliar a emergência de cidadãos portugueses do que designa por «elite negra, indiana, chinesa ou cigana de Portugal».
Christiana Martins considera que Portugal ainda vai atrás dos Estados Unidos ou da França e que os membros destas elites que conseguem afirmar-se nos centros de decisões são: «São muitos, mais do que se vê, menos do que deveria ser». Intencional mente deixou de fora o desporto ou a música, áreas em que a emergência se revela, apesar de tudo, mais fácil.
É interessante ler as diferentes formas, como os que aceitaram falar, abordam esta questão, mas o fundo da questão pode sintetizar-se da forma como o coloca Roberto Carneiro: «[é] evidente que o acesso de cargos de destaque público em Portugal está longe de reflectir a multiplicidade étnica e sócio-cultural do país, nomeadamente, na proporção demográfica das diferentes comunidades sócio-culturais residentes».
A Nação cosmopolita, que somos cada vez mais, tem de criar condições para assegurar uma efectiva igualdade de oportunidades e uma participação equitativa (em inglês “fair”) de todos os cidadãos nacionais nos centos de decisão a nível da sociedade ou das instituições do Estado.
Temos de reconhecer que o PS tem sido o partido pioneiro em matéria de alargamento da cidadania. Tem-no feito através das políticas de imigração que tem promovido desde o início dos anos 90, com a preocupação de incluir nas listas para deputados à Assembleia da República cidadãos de diferentes origens, pela abertura à participação de cidadãos estrangeiros a nível local, através da possibilidade de filiação e participação como militantes de cidadãos residentes legais nacionais de Estados membros da União Europeia ou da Comunidades dos Países de Língua Portuguesa, residindo legalmente em Portugal, que resultou de uma proposta que subscrevi com José Lamego e Celeste Correia e foi apadrinhada por António Guterres. O PS continuou a alargar a cidadania com a nova lei da nacionalidade.
Temos de ter orgulho no que fizemos, mas temos de estar insatisfeitos perante a falta de participação equitativa que se verifica.
Porque é que a pluralidade dos portugueses não tem rosto na RTP? Porque é que não há mais deputados e autarcas de diferentes origens? Porque é que não há mais participação nos diferentes órgãos do PS? Poderíamos continuar com os porquês.
O PS e a esquerda democrática precisam nesta matéria de uma nova agenda reformadora, que não é difícil de elaborar, que rejeite a indiferença, por um lado, e por outro, políticas de quotas de inspiração multiculturalista, que não são necessárias para atingir os objectivos que se pretendem e que teriam efeitos perversos de segmentação social.
Com imaginação social é possível avançar. O que faz falta não é a politização da etnicidade, é mais cidadania e participação equitativa para todos.
domingo, março 30, 2008
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
3 comentários:
Dr. José Leitão, todos os que o conhecem sabem quanto esta matéria lhe é cara e que não fica pela simples retórica. Eu fui uma das entrevistadas e recebi palavras de apreço de vários sectores, elogiando inclusive o meu desempenho. É obra sua! Abriu-me a janela de oportunidade ao convidar-me para a sua assessora enquanto primeiro Alto Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas, tudo o que se seguiu partiu daí.
Tenho pensado muito no lamento de Martin Luther King: «O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons!».
Força Dr. José Leitão
Romualda Fernandes
Enviar um comentário