domingo, fevereiro 15, 2009

PARTIDO SOCIALISTA - UMA RECENTRAGEM à ESQUERDA?



O XVI Congresso do Partido Socialista é um facto político de grande importância não só pelo facto de estar no governo, mas também porque estamos no limiar de um novo ciclo político, realizando-se durante este ano três actos eleitorais decisivos para o futuro do País.
Como defendi aqui cabe ao PS a enorme responsabilidade de continuar a merecer, em muitos casos recuperar, a confiança dos eleitores, quer pela sua acção governativa, quer pelas políticas que defina para este novo ciclo político.
Disse também que não devemos ter ilusões, sem o Partido Socialista a esquerda não marcará o próximo ciclo político. Se o Bloco de Esquerda conseguir retirar a maioria absoluta ao Partido Socialista a única coisa certa é que teremos piores políticas e menos progressistas do que se o PS tiver maioria absoluta.
O Bloco de Esquerda ao romper a coligação com o PS na Câmara de Lisboa e a retirar a confiança política a José Sá Fernandes, sem qualquer razão válida, deu um sinal claro de que a preocupação são apenas alguns ganhos eleitorais e não que a esquerda governe Lisboa e prossiga as políticas que a coligação contribuiu para promover, como foi a aprovação do Plano Verde para Lisboa ou a resolução, através do tribunal arbitral, da situação dos trabalhadores precários.
A moção política “PS: A Força da Mudança” apresentada por José Sócrates, que podem ler aqui, é uma resposta positiva à necessidade de formular políticas que respondam à crise, inscrita na tradição do socialismo democrático, na qual reconheço muitas das ideias e propostas que apoiei ou defendi em anteriores congressos do PS. Subscrevo, sem hesitar a afirmação de que assistimos “à derrota da lógica do pensamento único” e que: “O mundo acaba de assistir á clamorosa derrota do pensamento político neoliberal. A ideologia do mercado entregue a si próprio, sem Estado sem regulação capaz, e a especulação desenfreada nos mercados financeiros são os responsáveis principais pela profunda crise que se abateu sobre toda a economia mundial…. Não pode ser resolvida recorrendo aos princípios, às práticas e às políticas que a provocaram. É preciso responder com mais regulação e com firme defesa do interesse público.” Considero também muito positivo que se defenda que a Europa: “deve tomar as iniciativas necessárias à eliminação, à escala global, das zonas de privilégio e excepção que na prática funcionam, como os off-shores, como indutores de opacidade, à especulação e evasão fiscal”.
A ideia de Estado Estratega, que me é cara, é afirmada, quando se refere que: “O PS é partidário da economia de mercado e defensor do papel estratégico do Estado democrático, com capacidade reguladora, mas adversário do proteccionismo e do colectivismo”.
Recomendo a todos a leitura da moção. Mesmo que se não concorde com todas as análises e propostas, é manifesto que se trata de um texto político de referência.
Não bastam, contudo, boas propostas, o Partido Socialista tem demonstrar de forma inequívoca, na sua prática interna ser um partido inclusivo, que premeia a qualidade e não a subserviência, que aceita avaliar o resultado das políticas, que não confunde a crítica interna, com o confronto parlamentar.
Deve também ter por preocupação responder às angústias e às esperanças dos cidadãos particularmente dos que são mais vulneráveis neste momento face à crise. É tendo em contas as pessoas, que sempre defendemos que devem estar em primeiro lugar, que devemos definir racionalmente, as prioridades da nossa agenda política. Trata-se de unir esforços e fazer convergir vontades da forma mais alargada possível e não dividir a nossa base social de apoio natural.
Este é o momento de procuramos construir não qualquer forma de unanimismo, e é positivo que tenham sido apresentadas outras moções subscritas respectivamente por Fonseca Ferreira e por António Brotas, que podem ler respectivamente, aqui e aqui ou que se façam leituras críticas da moção apresentada por José Sócrates, como a de Manuel Alegre aqui, mas temos todos a obrigação de contribuir para a unidade necessária sem a qual não conseguiremos enfrentar com sucesso os próximos desafios eleitorais. É preciso mais cidadania também no interior do Partido Socialista, que se não confunde com o apoio acrítico a todas as medidas e propostas, nem com uma atitude de sistemática desconfiança relativamente à acção governativa, mas que exige que se apoie aquilo com que se concorda e discorde do que consideramos errado ou mal aplicado.
Se o fizermos estaremos a contribuir para uma necessária recentragem do Partido Socialista à esquerda, a afirmar a actualidade do socialismo democrático face à crise, e mereceremos ter de novo a confiança de uma grande maioria dos portugueses, assegurando as condições para que o PS continue a ser a força da mudança.

domingo, fevereiro 08, 2009

NÃO À XENOFOBIA, SIM AOS DIREITOS HUMANOS

A crise, para além da destruição de empregos que acarreta, o que põe em causa o direito ao trabalho de muitos cidadãos, serve também de pretexto para despedimentos injustificados, causando mais desemprego, ansiedade e mal-estar.
A crise é um contexto fértil para todas as manipulações, para tudo o que contribui, parafraseando um verso de Sophia de Mello Breyner Andresen, para tornar as almas mais pequenas, ou mais cruamente para todas as derivas populistas, que procuram fazer avançar a sua agenda racista e xenófoba, ou se resignam a ela por falta de iniciativa política e social.
É nos momentos de crise que se torna ainda mais grave transigir sobre os princípios democráticos e que temos de nos bater como cidadãos pelos direitos de todos, nacionais ou estrangeiros.
Os recentes protestos e greves selvagens contra a contratação de estrangeiros, emigrantes portugueses e italianos, em dezenas de refinarias de petróleo, terminais de gás e centrais eléctricas, são um sinal grave, que não teve a resposta rápida e firme que era de exigir do governo britânico e dos poderosos sindicatos britânicos.
O ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, afirmou, de imediato: “Essa tentativa de discriminação é absolutamente inaceitável para o governo português”.
Acrescentou: “Queremos enfatizar a absoluta responsabilidade que os governos têm de assumir de evitar uma deriva proteccionista, xenófoba, nacionalista, que, se não for travada muito rapidamente por iniciativas muito fortes dos governos, nos pode arrastar para uma crise ainda maior”.
O princípio “british jobs for british workers” não é apenas é criticável porque as vítimas são, neste caso, trabalhadores comunitários, portugueses e italianos, violando por isso frontalmente a legislação comunitária. Temos também de rejeitar a discriminação em razão da nacionalidade na contratação de qualquer trabalhador, que se encontre legalmente num país. A invocação de uma preferência nacional ou comunitária na contratação de trabalhadores, legalmente residentes, para justificar uma discriminação em razão da nacionalidade, tem de ser considerada como uma forma de discriminação racial, como prevê a legislação portuguesa.
Da Itália de Berlusconi, só vêm más notícias e maus exemplos em matéria de imigração e direitos humanos. A Itália tornou-se um país incapaz de gerir os fluxos migratórios, mas a opção não pode ser pôr em causa a dignidade e os direitos humanos mais elementares dos imigrantes. A recente aprovação pela maioria do Senado italiano, com o voto favorável de 156 senadores da coligação de Berlusconi, de uma emenda às leis de segurança interna para que os médicos denunciem os imigrantes ilegais que acorrem aos serviços de saúde representa a ultrapassagem de um limiar intolerável.
È uma lei que rasga os princípios deontológicos da ética médica, brutalmente desumana e estúpida, que aplica a todos os imigrantes ilegais, incluindo às mulheres que, como referiu a senadora Anna Finocchiaro, do Partido Democrático, “vão deixar de ir aos hospitais para dar à luz ou para que os seus filhos sejam tratados” (Público, 6 de Fevereiro, de 2009). Os imigrantes “vão preferir a morte `à expulsão” avisou Jean-Leonard Touadi, único deputado negro italiano, nascido no Congo.
Estes sinais evidenciam que os valores e os direitos humanos nunca estão garantidos de forma irreversível em qualquer país, que a barbárie, a regressão política e histórica são sempre possíveis se a inércia dos democratas o permitir.
A batalha contra estas medidas, discursos e atitudes, não é exclusiva de ninguém. Tudo isto faz emergir novas linhas de clivagens, que não recobrem sempre as naturais divisões entre esquerda e direita. As novas lutas pela qualidade da democracia exige novas convergências entre todos os democratas, sejam laicos, cristãos ou de outras confissões religiosas, na defesa dos direitos humanos de todos.
Temos que recusar, por exemplo, que o exercício dos direitos humanos básicos e fundamentais, como é o direito à saúde, possa ser subordinados a qualquer condição de estatuto legal, preferência nacional, ou comunitária.
Para vencer a crise económica não são suficientes respostas económicas, é preciso fazê-las acompanhar de maior coesão social, do respeito intransigente pela dignidade e pelos direitos humanos de todos.

segunda-feira, fevereiro 02, 2009

LISBOA VISTA DE CACILHAS


José Rosa, pintor e fotógrafo amador, enviou-me esta foto, como comentário ao que escrevi ontem sobre Lisboa Capital -Coração da Lusofonia e Cidade Global.
Foi tirada esta manhã do interior de um cacilheiro, pelas 11h45m. Este comentário, que agradeço, vale por muitas palavras e pretende homenagear a luz branca de Lisboa. José Rosa é responsável, conjuntamente com a australiana Kaye Menner, do blogue de fotografias http://kayeandjose.blogspot.com/.

domingo, fevereiro 01, 2009

LISBOA CAPITAL - CORAÇÃO DA LUSOFONIA E CIDADE GLOBAL

As cidades disputam de forma cada vez mais intensa o seu lugar na nova geografia internacional, aspiram a ser cidades globais. Para ser uma cidade global, Lisboa terá realizar com eficácia a sua função de capital relativamente a Portugal, e potenciar as oportunidades que resultam de ser o coração da lusofonia. Estando em curso em http://cultura.cm-lisboa.pt/ uma reflexão sobre a vocação capital e internacional da cidade, no quadro da definição de Estratégias Para a Cultura em Lisboa, quero deixar o meu contributo.
A capitalidade exige que Lisboa não seja apenas a sede dos órgãos de soberania, mas que a cidade esteja articulada, com rapidez e comodidade, com todo o País, através do transporte viário e ferroviário, que esteja ligada ao mundo pelo porto e por um aeroporto, sem esquecer as outras formas de comunicação potenciadas pelas novas tecnologias. Tem de estar também em estreita conexão com a riqueza da diversidade da criação cultural nas diferentes cidades e regiões do País, incluindo os Açores e a Madeira e contribuir para a sua circulação a nível nacional e internacional.
Alejandro Portes, grande sociólogo contemporâneo tem sublinhado que: «O novo espaço transnacional, marcado pela presença das cidades globais, é criado por fluxos sustentados de capital, tecnologia, informação (…) e pessoas» (in Estudos Sobre As Migrações Contemporâneas, Lisboa, ed. Fim o Século, 2006, p.38).
Devemos por isso valorizar tudo o que possa contribuir para colocar Lisboa nos mapas internacionais da ciência, da cultura, para ancorar Lisboa na economia global.
Lisboa já não é uma cidade de industrias tradicionais, de que as inúmeras chaminés são um testemunho a preservar em termos de arqueologia industrial, mas tem de desenvolver novas actividades económicas que sejam clusters em termos de desenvolvimento económico, especializações em áreas científicas, nomeadamente nas ciências da saúde, centros universitários de excelência, indústrias culturais, designadamente, moda, design, vídeo e cinema.
Tem de saber valorizar as sedes de organizações internacionais que nela se situam, associando essa presença à sua condição de cidade cosmopolita. A instalação da Agência Europeia da Segurança Marítima, cujas funções podem ver aqui, é uma oportunidade que não pode ser perdida para a tornar um grande pólo europeu de actividades de investigação e regulação dos oceanos. Lisboa é também a sede do Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência, cujas funções podem ver aqui.
Deve também valorizar o facto de ser a sede de Fundações privadas, que têm um papel destacado na promoção da cultura, e da ciência ou na acção humanitária a nível internacional, como, por exemplo, a Fundação Calouste Gulbenkian aqui, ou a Fundação Champalimaud aqui ou outras instituições como o Centro Nacional de Cultura aqui.
Os imigrantes que nela vivem e trabalham representam uma outra oportunidade para o desenvolvimento da cidade devido ao contributo que dão para a demografia, para a vida económica e cultural, Podem, além disso contribuir para diversificar e densificar as relações de Lisboa com os seus países de origem, valorizando-a como cidade global, como uma grande metrópole cosmopolita.
Lisboa deve, aliás, empenhar-se na atracção de estudantes internacionais, designadamente, estudantes Erasmus, de profissionais qualificados, de artistas em processo de criação, que potenciem o seu cosmopolitismo e reforcem a sua competitividade em termos internacionais.
Tem de ser cada vez mais, uma cidade competitiva e dinâmica, integrada nas grandes redes de circulação de pessoas, de informação e mercadorias.
O caminho para ser uma cidade global passa por ser cada vez mais o coração do mundo lusófono. Lisboa é hoje o centro de uma vasta produção cultural afro-luso-brasileira, que é divulgada para todo o mundo de Língua portuguesa, graças às editoras, mas também através da RDP ÁFRICA aqui, da RTP África aqui, da RTP Internacional aqui, onde se afirmaram internacionalmente criadores como José Eduardo Agualusa aqui e Ondjaki aqui.
Devemos por isso ter em conta, que é em Lisboa, que está instalada a sede da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) aqui.
É também a sede da UCCLA -União das Cidades Capitais Luso-Afro-Américo-Asiáticas aqui de que a Câmara de Lisboa é membro fundador. Seria muito bom que fosse capaz de promover uma Rede de Cidades Lusófonas, que funcionasse como uma alavanca para práticas e políticas que conduzam à capacitação, à melhoria do bem-estar e da prosperidade das pessoas abrangidas.
Cada cidade tem o seu caminho para se tornar uma cidade global, No caso de Lisboa é partindo do que já é, a capital de Portugal, coração da lusofonia, uma cidade tolerante e ecuménica, com uma luz magnífica e uma população calorosa e generosa, que poderá ser a capital Atlântica da Europa, uma cidade global.