domingo, abril 06, 2008

VIOLÊNCIA SOBRE IDOSOS, DIGNIDADE E CIDADANIA

A APAV, Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, denunciou o aumento da violência sobre os idosos em 2007. Segundo os dados divulgados pelo Público, de 5 de Abril de 2008, «o número idosos que se queixaram à APAV aumentou 20 por cento em 2007», tendo sido «665 as pessoas com mais de 65 anos que recorreram à associação de Apoio à Vítima (APAV)». Os idosos queixam-se de maus-tratos, designadamente, ameaças e coacções, difamações, injúrias, agressões corporais, queixam-se de maus-tratos físicos, mas cada vez mais de maus-tratos psíquicos. De entre os idosos, segundo a APAV, as mulheres são as principais vítimas (80 por cento).
Este número é apenas uma parte imersa do icebergue da violência que atinge os idosos. A presidente daquela instituição, Joana Marques Vidal, referiu ao Público que «o número de pedidos de ajuda registados na associação é inferior ao dos crimes contra idosos que motivaram queixa judicial e, por maioria de razão aos efectivamente cometidos».
Esta questão não é um problema menor, nem menos grave que a violência nas escolas.
É por isso positivo que o Procurador-Geral da República tenha considerado a violência sobre os idosos como uma questão prioritária. Os direitos dos idosos só serão respeitados se forem desafiados a ter um papel activo como cidadãos na sua concretização.
Estou convencido que o aumento das queixas por parte dos idosos, como referiu a presidente da APAV, «resulta de uma maior consciência dos seus direitos». Seria muito importante que Manuel Alegre, um dos poucos políticos que se tem preocupado com a situação de invisibilidade social e de exclusão de que são vítima tantos idosos, conseguisse ver aprovada a sua proposta de criação de um Parlamento Sénior, que permitisse levar junto da Assembleia da República a voz dos idosos, as suas angústias e esperanças.
Esta é uma medida fracturante numa sociedade indiferente em que se verificou uma perda considerável de peso social por parte dos idosos, ao mesmo tempo que o seu número cresce, graças ao aumento da esperança de vida.
A sociedade portuguesa que mudou tanto, e em muitos aspectos, de forma admirável nos últimos trinta anos, tornou-se mais fria e brutal para os idosos como o demonstraram António Barreto e Joana Pontes no primeiro documentário da excelente série ”Portugal, Um Retrato Social”, edição RTP/Público. Como afirmou António Barreto, «Os idosos vivem cada vez mais sós». Creio que este facto não nos pode deixar indiferentes e que nos devemos interrogar sobre o que fazer para promover uma maior solidariedade e cooperação entre as gerações no novo contexto social.
O complemento solidário para idosos foi uma medida social positiva do actual governo que procurou apoiar os idosos com maior risco de pobreza, mas são necessárias novas medidas e iniciativas.
Temos de reconhecer que há muito para fazer de forma a combater todas as discriminações como a recentemente denunciada da não-aceitação por parte de alguns lares de idosos apoiados pelo Estado de idosos seropositivos, mas sobretudo há que desenhar medidas que favoreçam a permanência dos idosos nas sua casas ou no seio das suas famílias e que promovam a sua autonomia e responsabilidade.
Portugal está a desbaratar a informação, a cultura, a capacidade criadora, a generosidade de milhares e milhares de idosos. Falta imaginação às empresas, ao Estado e ao sector social para mobilizar o contributo dos idosos.
Não somos um país tão rico em capital social e cultural, que nos possamos dar a esse luxo, mas essas atitudes revelam além disso uma lógica de exclusão que os idosos devem recusar.
Gostaria por isso de terminar com uma referência a dois idosos que nos mostram com a sua intervenção cultural e cívica que todos somos imprescindíveis para a construção de um Portugal mais moderno, culto justo e solidário. Refiro-me ao cineasta Manuel de Oliveira e à Professora de estudos clássicos Maria Helena da Rocha Pereira, recentemente galardoada com o Prémio de Cultura Padre Manuel Antunes 2008.
Não basta lutar contra a violência sobre os idosos, há que reconhecer o contributo, que continuam a dar, a maioria das vezes de forma discreta e silenciosa, para a construção da cidade futura.

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