domingo, abril 29, 2007

JORGE SAMPAIO E A ALIANÇA DAS CIVILIZAÇÕES

A designação de Jorge Sampaio como Alto Representante das Nações Unidas para a Aliança das Civilizações pelo Secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, é uma boa notícia porque representa um empenhamento reforçado das Nações Unidas nesta área e porque o escolhido é uma personalidade competente para desempenhar estas funções, como se apressaram a sublinhar os governos de Espanha e da Turquia.
Estes dois países que tiveram um papel pioneiro na definição dos objectivos na definição dos objectivos da Aliança das Civilizações, que foi apadrinhada posteriormente pelo anterior Secretário-Geral das Nações Unidas, Kofi Annan, receberam com satisfação esta designação
Não deixa de ser interessante confrontar a escolha de um português com o discurso de Kofi Annan proferido em Fevereiro de 2007, em Istambul, no qual a propósito da Aliança das Civilizações referiu, designadamente, que: «A fusão das diferenças, sejam de opinião, de cultura, de credo ou de modo de vida, foi sempre o motor do progresso humano. Na época em que a Europa atravessava a idade das trevas, a Península Ibérica construiu o seu progresso sobre a interacção entre as tradições muçulmanas, cristãs e judaicas. Mais tarde o Império Otomano prosperaria graças, sem dúvida, ao seu exército, mas também porque, neste império de ideias, a arte e as técnicas muçulmanas foram enriquecidas pelas contribuições judaicas e cristãs».
A escolha do antigo presidente da República portuguesa, que sempre defendeu a adesão da Turquia à União Europeia representa uma escolha de uma personalidade com um perfil adequado para o desempenho das funções que lhe foram cometidas.
Jorge Sampaio considerou que este convite é o “reconhecimento do papel histórico que Portugal tem vindo a assumir”.
É justo sublinhá-lo e valerá a pena ter presente que em Portugal, católicos e outros cristãos, muçulmanos, sunitas e ismailitas, judeus, hindus, baha’is e budistas têm desenvolvido um saudável diálogo inter-religioso, assente no respeito pela dignidade e liberdade de todos os seres humanos.
A Aliança das Civilizações, não suscitou ainda o debate alargado que a sua importância estratégica justifica.
A Aliança das Civilizações não se reduz, ao diálogo inter-religioso. O que distingue um muçulmano saudita de um muçulmano turco ou um cristão português de um cristão sírio ou iraquiano, não é do domínio do religioso, mas sim do histórico, do político e do cultural. É necessário por isso alargar o debate a um leque mais alargado de protagonistas.
Manuel Alegre no seu Contrato Presidencial defendeu que: «Portugal deveria fazer também seu, o programa de aliança de civilizações no seguimento do diálogo de civilizações preconizado pela UNESCO. Temos de tornar claro que não interpretamos o extremismo religioso como fazendo parte da cultura islâmica, com a qual temos laços de proximidade que devemos aprofundar».
É uma posição de grande lucidez cultural e política, que aponta para o que devemos fazer a nível nacional. Combater as estratégias assentes na tese do “choque de civilizações” de Samuel Huntington, não é da exclusiva competência, nem da exclusiva responsabilidade dos que têm estado empenhados no diálogo inter-religioso.
Jorge Sampaio ao assumir esta nova tarefa, com a determinação com que exerce sempre as funções que assume, como o demonstrou recentemente como emissário especial das Nações Unidas para a Luta contra a Tuberculose, está confrontado com um grande desafio. Está quase tudo por fazer. Existe um Relatório elaborado por um conjunto de personalidades de alto nível para servir de orientação à sua acção, este sítio na Rede, e será por isso necessário utilizar toda a sua competência, capacidade de trabalho, inteligência e prestígio para dar um conteúdo efectivo às suas novas funções, de forma a não desiludir a esperança que a sua nomeação a suscitou a nível internacional.
É importante que o nosso Ministério dos Negócios Estrangeiros providencie para que o relatório esteja acessível em português e não apenas em árabe, chinês, francês, russo, espanhol e turco, como até agora.
Quando o governo português considera, e muito bem, que esta nomeação contribui para o prestígio de Portugal, há que tirar desse facto as devidas consequências e criar condições para que seja efectivo e visível o nosso contributo para a Aliança das Civilizações.

1 comentário:

Luís Novaes Tito disse...

Caro José Leitão
Convido-te a ler o pensar que se lê na caixa de comentários do texto 534/2007 do Tugir sobre a indigitação de Sampaio.
Um espanto de lucidez...