domingo, junho 22, 2008

A UNIÃO EUROPEIA, A IMIGRAÇÃO E O MUNDO

A União Europeia é um espaço económico muito significativo, que ambiciona desempenhar um papel político mais relevante na cena internacional, mas é apenas uma pequena região do mundo se considerarmos o seu peso demográfico.
Como tivemos oportunidade de referir aqui que Presidência portuguesa da União Europeia foi muito positiva. Saudámos aqui por esse facto o Governo e a diplomacia portuguesa. Foi-o, nomeadamente na projecção de uma União Europeia aberta ao diálogo com outros espaços geográficos e políticos, do Brasil à Africa, passando pela Rússia ou pela China
Estamos num período difícil, e bem diferente, a nível da União Europeia.
Sucedem-se um conjunto de factos que não são positivos: o resultado do referendo na Irlanda e as hesitações checas ameaçam a entrada em vigor do Tratado de Lisboa; as conclusões do último Conselho Europeu não deram resposta à crise energética; a aprovação da Directiva Retorno é um sinal encorajador para as políticas negativas em matéria de imigração, o que é particularmente grave quando se conhecem as perspectivas da Presidência francesa da União Europeia; a Directiva sobre o horário de trabalho vem pôr em causa um progresso social, que se julgava consolidado.
As organizações de direitos humanos foram derrotadas na votação da Directiva Retorno, mas não foram apenas elas que foram derrotadas, também o foram as Igrejas, as organizações laicas, as associações de imigrantes, que acreditavam existir uma maioria no Parlamento europeu para recusar os aspectos mais contestados dessa directiva. Foram igualmente derrotados os empregadores europeus que precisam de trabalhadores para fazer face à crise, as famílias e as instituições que precisam de trabalhadores não especializados para cuidar das casas, dos idosos, ou dos doentes. Neste momento, tenta-se fazer passar por verdade uma grande mentira: pretende-se fazer crer que a União Europeia só precisa de trabalhadores altamente qualificados, ignorando que em muitas áreas precisa de trabalhadores não qualificados. Esta omissão dificulta a imigração legal desses trabalhadores e /ou a legalização desses trabalhadores que por isso têm mais dificuldade em ter acesso a trabalho com direitos.
A AEDH, Associação Europeia dos Direitos do Homem, na sequência da aprovação da Directiva Retorno apelou aqui a todos os cidadãos e residentes, aos eleitos, da União Europeia para erguer a sua voz, protestar vivamente, e tudo fazer para se opor á sua entrada em vigor. É compreensível, mas insuficiente.
Não podemos ignorar a necessidade de acompanhar o processo de discussão na Comissão das Liberdades Cívicas, Justiça e Assuntos Internos do Parlamento Europeu de duas outras directivas sobre política comum de imigração: a proposta de directiva que estabelece sanções contra empregadores de imigrantes ilegais; e a proposta relativa às condições de entrada e de residência de nacionais de países terceiros para efeito de emprego altamente qualificado, como pode ver aqui.
Tudo isto acontece no contexto da ofensiva de Sarkozy e Berlusconi contra os imigrantes. O Ministro francês da imigração apresentou recentemente, como pode ver aqui, um “Pacte européeen sur l’immigration et l’asile ”que gostaria de fazer aprovar durante a Presidência francesa da União Europeia. É uma proposta que deve mobilizar a crítica e a rejeição dos defensores dos direitos humanos, dos governos progressistas da União Europeia, como o português e o espanhol, e dos eurodeputados progressistas ou, pelo menos sensíveis, aos interesses da União Europeia no Mundo. O referido pacto obedeceria às seguintes prioridades: promover uma imigração escolhida e concertada de carácter profissional, em prejuízo da imigração ligada ao reagrupamento familiar que há que controlar; os estados devem combater a imigração ilegal e não fazer no futuro regularizações de carácter geral; melhorar os controles fronteiriços, sistematizando o recurso à biometria e sendo solidários com os países mais expostos próximos das fronteiras exteriores; lançar as bases de uma Europa de asilo, promovendo a troca de informações sobre os candidatos ao asilo entre os Estados-Membros; e por último, o desenvolvimento solidário para construir um partenariado, com os países de origem e trânsito ao serviço do desenvolvimento.
O pacto pode não ser aprovado se os cidadãos europeus, as suas organizações e representantes no Parlamento Europeu forem sensíveis aos direitos humanos e aos interesses da União Europeia no Mundo.
A Comissão Europeia tem reservas, designadamente, ao contrato de integração que se pretende que os imigrantes aceitem obrigatoriamente, que pode levar a discriminações. A Espanha, que legalizou em 2005 seiscentos mil imigrantes, tem manifestado reserva considerando que algumas das propostas violam a Constituição espanhola.
Não nos iludamos. A linguagem cifrada das propostas francesas podem enganar eurodeputados, ansiosos por se deixar enganar, mas não iludem os dirigentes dos Estados da América Latina.
A aprovação da Directiva Retorno está a ter um efeito muito negativo nas relações com Estados da América Latina que estão a procurar criar uma frente comum com os Estados Africanos contra esta política.
Para que a União Europeia se afirme como um pólo de esperança e autoridade moral na cena internacional é necessário avançar com a ratificação do Tratado de Lisboa, mas é também necessário não confundir política comum de imigração, com as políticas xenófobas e estúpidas defendidas por Sarkozy e Berlusconi.

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