domingo, junho 08, 2008

MEMÓRIAS DO CIDADÃO JOSÉ DIAS

Não podia deixar de ler o livro de José Dias “Memórias do cidadão José Dias”, editado, recentemente pela Afrontamento e de ter começado pelo capítulo “Movimento Estudantil e Acção Católica, 1965 a 1970”, porque foi o período em que me cruzei com ele em Coimbra, nos períodos que antecederam e se seguiram à greve estudantil de 1969.
Este livro singular, mais do que um livro de memórias é uma minuciosa prestação de contas e, como escreveu Adelino Gomes: «em certos trechos causador de algum desconforto, tantos e tão pessoais chegam a ser os pormenores que nos confia». (vide “O bravo cidadão José Dias presta contas”, Ípsilon, Público, 23 de Maio de 2008).
José Dias refere exaustivamente todas as diferentes fases da sua vida: militância na JOC (Juventude Operária Católica); na Juventude Universitária Católica, no Movimento Estudantil e no Movimento da Esquerda Socialista; participação activa no Sindicato do Vestuário do Minho; actividade profissional na Agência de Viagens Abreu, no Inatel, com Eduardo Graça; assessor político do Presidente da República, Jorge Sampaio; dirigente associativo, em Coimbra, onde reside.
Neste tempo em que há tantos agentes políticos de celofane, é bom sermos confrontados com as memórias de um cidadão que em 2008 completou cinquenta anos de ininterrupta actividade cívica, com um significativo percurso como Cidadão e Democrata.
A ele aplicam-se, com justiça, os versos de Bertolt Brecht no qual que diz que os lutam toda a vida, esses são imprescindíveis.
Este livro tem elementos úteis para a história do Movimento da Esquerda Socialista e para conhecer os bastidores da Presidência da República, mas é também um contributo extremamente importante para perceber em que medida os movimentos da Acção Católica, designadamente, a Juventude Operária Católica e a Juventude Universitária Católica foram escolas de militância cívica.
Permitam-me que à margem do livro, repita que a Acção Católica faz imensa falta e que é fundamental perceber como continua a ser imprescindível, um movimento como a Juventude Operária Católica, que pode conhecer aqui.
Registe-se o testemunho de José Dias: «Aprendi desde cedo o método de Revisão de Vida, que sempre me acompanhou e nunca deixará de me acompanhar: o Ver, o Julgar e o Agir, que de tanto explicado, repetido e aplicado, se tornou um método para a vida toda».
É também de sublinhar que José Dias fez questão de escrever, como se empenhou enquanto católico com outros católicos, nas lutas de operários e estudantes.
Muitas perguntas que fui fazendo ao longo da leitura do livro ficaram sem resposta, como esta, por que razão um militante tão profundamente marcado pela experiência cristã, escreve depois de referir a sua participação nos campos de férias da JAC, JEC, JOC e JUC, no Verão de 70: «Essa participação foi para mim muito rica e como que representou o adeus à Acção Católica e à Igreja Católica».
Estou certo que José Dias continuará a escrever páginas que retratem a sua luta pela cidadania e que muito ficou por escrever, não no que se refere à sua participação pessoal, mas sobre o que sabe e podia contar com mais detalhe sobre as actividades e movimentos em que participou activamente.
Faz parte da pose dos que escrevem as suas memórias concluir, dizendo que se tivessem de começar de novo fariam tudo na mesma. São por isso singulares e merecem ser citadas as palavras de José Dias: «Tive muita sorte com a vida e estou de bem com ela. Talvez não voltasse a fazer algumas coisa que fiz e espero ter oportunidade de no futuro não repetir esses erros, caminhando serenamente activo até ao final».

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