domingo, junho 29, 2008

PENSAR A GLOBALIZAÇÃO E AS CRISES

Pensar criticamente a evolução presente das relações internacionais, procurar um sentido para a globalidade, é cada vez mais urgente, quando estamos confrontados com o aumento do preço dos combustíveis e dos cereais e uma crise económica internacional sem precedentes.
Torna-se necessária uma nova reflexão sobre o estado da economia mundial, as necessidades e possibilidades de regulação do que se tem designado como globalização.
Como cidadãos intervenientes não nos podemos resignar à inevitabilidade da ordem existente, mas também não podemos ignorar que sem ideias e políticas claras, sem uma nova diplomacia, se corre o risco do agravamento das desigualdades entre os Estados e dentro dos Estados, e à ameaça de novos conflitos e guerras.
Neste contexto, é imprescindível a leitura do livro “ Rituais de Apaziguamento, Escritos sobre relações internacionais”, de Luís Moita, editado recentemente pela UAL, Universidade Autónoma de Lisboa.
Do conjunto de escritos reunidos neste volume destacaria os relativos a centros e a periferias na ordem política internacional, universalismo e globalismo, a propósito do conceito de império, a nova diplomacia, ética e relações internacionais.
São particularmente úteis para pensar os actuais desafios.
O estado da economia mundial que Nicolau Santos no “Expresso” de 29 de Junho de 2008, caracteriza como “a tempestade perfeita” e de que faz uma leitura implacável num artigo que exige uma leitura atenta, obriga-nos a procurar caracterizar com rigor o que se passa, para procurar formular políticas alternativas.
Será exacto afirmar, como faz Nicolau Santos, que as necessidades das novas economias emergentes da China ao Brasil passando pela Índia e Rússia «…e a ascensão das respectivas classes médias estão a originar a subida exponencial dos preços das matérias primas e bens alimentares»? Só se conseguirmos identificar com rigor a realidade, será possível agir de forma eficaz.
aqui tínhamos referido que para além de aspectos conjunturais ligados a situações climáticas ou a erradas opções políticas, há um dado que irá marcar cada vez mais a economia mundial, a emergência da pobreza de milhões de consumidores. Falta acrescentar que os aumentos dos preços criam e agravam a situação de pobreza de outros milhões de seres humanos a nível mundial.
Nada disto nos obriga a aceitar como inevitável a forma como se processa a globalização económica e financeira, que maximiza os lucros de alguns e exclui milhões da satisfação das necessidades básicas.
Temos de entender que a globalização, é «um processo multidimensional, que inclui factores de ordem científica e tecnológica, informativo-comunicacional (logo sociocultural), político-ideológica, geopolítica, macroeconómica.», como sublinha Luís Moita.
Acrescenta que «a globalização é acompanhada pela fragmentação, pois os seus processos são afinal circunscritos, gerando vastas zonas de distanciamento».
Penso que é necessário ter também presente contributos para esta reflexão como os de Fareed Zakaria “The Post-American World: The Rise of the Rest”, a que se referiu recentemente no Público Teresa de Sousa num artigo intitulado significativamente “As outras faces da globalização”.
Luís Moita defende que «cabe-nos recuperar o universalismo, que está longe de absorver o indivíduo na totalidade, e que se deveria consubstanciar, entre outras exigências, num novo contrato social de âmbito mundial».
O contributo de Luís Moita é importante para quem pensa que à esquerda não cabe apenas reflectir nos períodos de crise, deixando à direita o poder até ter encontrado as novas respostas, como não cabe igualmente considerar inevitável a lógica da actual globalização e das soluções defendidas pelo neoliberalismo.
A esquerda não pode deixar de pensar a globalização e as crises, procurar novas estratégias, e uma nova diplomacia para as concretizar.
A esquerda deve ter ambição não apenas de ocupar o poder, mas de exercer o poder para concretizar as suas políticas. Para isso é necessário, mas não suficiente, merecer continuar a ganhar eleições.
A esquerda tem de ser exigente e rigorosa na formulação das suas propostas, não ignorar a gravidade da crise económica internacional, estar atenta ao que emerge de novo e procurar, com humildade, novas respostas consequentes com os valores do socialismo democrático.

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