Votarei sim no próximo referendo na esperança que o meu voto contribua para uma lei mais equilibrada em matéria de interrupção voluntária da gravidez.
Considero que devem ser criadas todas as condições para evitar e reduzir o mais possível o recurso ao aborto, mas entendo também que devo votar “sim” à despenalização proposta no referendo. Para além dos valores da defesa da vida ou da livre escolha, sou também sensível a outros valores como os da responsabilidade e da compaixão, que em sentido etimológico significa a capacidade de ser sensível ao sofrimento dos outros.
A vida intra-uterina constitui um bem constitucionalmente tutelado, e este reconhecimento é independente de concepções filosóficas ou religiosas sobre o início da vida humana, donde deriva a obrigação do Estado de a defender
Considero, como muitos outros que defendem o sim, que deveriam ser adoptadas medidas como a obrigatoriedade de uma prévia consulta de aconselhamento e o estabelecimento de um período entre a consulta e a intervenção abortiva para assegurar que a mulher tomou a decisão de forma livre, informada e não precipitada, evitando-se a interrupção da gravidez motivada por súbito desespero.
Seria muito positivo que os partidos que apoiam a despenalização assumissem antes do referendo o compromisso de prever estas medidas na futura lei. A sua ausência desprotegeria de forma desproporcionada a tutela da vida intra-uterina.
O que está em causa neste referendo não é “o direito ao aborto”, nem o ser “a favor do aborto”, mas o respeito pela consciência e pelo sentido de responsabilidade das mulheres que decidem interromper a gravidez até às dez semanas. A maioria dos abortos realizam-se em Portugal até às dez semanas e a lei penal tem-se revelado ineficaz para o evitar. A proibição contribui para o recurso ao aborto em situação ilegal, com consequências gravosas para a situação física e psíquica da mulher.
O aborto é motivo de conflito e sofrimento e é particularmente dramático para as mulheres mais pobres, mais jovens e mais excluídas, que são levadas a recorrer a ele sem condições de segurança por graves situações de carência económica ou por força dos preconceitos sociais. A penalização do aborto constitui um factor de maior sofrimento e de reforço da discriminação de que são vítimas na sociedade. Considero que a nossa intervenção cívica e política deve ter como um dos objectivos eliminar o sofrimento evitável e penso que a prevenção do aborto não exige a penalização dos que se verificam até às dez semanas. Confio na consciência bem informada e no sentido de responsabilidade das mulheres e dos cidadãos, em geral, para conseguir que o aborto seja raro.
Considero que é intolerável que muitas mulheres sejam levadas a abortar por força das difíceis condições económicas em que vivem ou por força dos preconceitos sociais que tendem a excluir mulheres que engravidam fora do casamento ou da união de facto.
São de louvar e apoiar todas as iniciativas da sociedade civil que se têm substituído à omissão do Estado nesta matéria.
Cabe também primeiro que tudo assegurar a educação sexual e o planeamento familiar a todos os cidadãos de forma a prevenir gravidezes indesejadas. Os diferentes governos têm-se demitido de fazer o que lhes compete nestas matérias, o que não pode continuar a acontecer.
Se o “sim” ganhar a minha agenda nesta matéria passa a ser a da promoção de condições sociais, culturais e legais para assegurar que todas as mulheres, independentemente da idade, condição social, origem ou fortuna, possam ter a liberdade de escolher ser mães e não sejam levadas a abortar sem o pretender.
domingo, fevereiro 04, 2007
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2 comentários:
Também eu vou votar "sim" no próximo dia 11. Não poderia concordar mais com tudo o que escreveu. É impensável imaginar que a despenalização vai trazer como consequência inevitável o aumento do número de abortos. Uma mulher, quando toma uma decisão como essa não o fará concerteza de ânimo leve... e ficarão marcas para sempre que a mulher jamais conseguirá apagar...
Finalmente, para além de subscrever o seu texto integralmente, não posso deixar de lhe dar os parabéns pelos seus textos sempre oportunos e interessantes.
Pelo "sim", aqui fica o meu comentário.
Caro Dr. José Leitão, permita-me que o felicite pela sua sempre constante coragem e frontalidade, que eu muito admiro.
Neste particular, gostaria de dizer que discordo do SIM, pois que, creio bem, o aborto combate-se com a ajuda efectiva às mulheres grávidas.
Também não concordo com a criminalização, pois que esta é mais uma “miséria” a somar a tantas outras… todavia, creio que a pergunta formulada no texto do referendo, vai tão só conduzir à mais perfeita liberalização da prática do aborto. E assim, pelo menos alguns de nós, católicos, não podemos estar de acordo.
Creio que a única forma de o aborto ser combatido é através de uma ajuda, no “terreno”, às mulheres grávidas.
“Vide” a “Voz da Verdade” (edição de 3791 de 4 Fev 2007), onde se refere a existência de 50 Instituições que em Portugal se dedicam a essa ajuda…
Apenas em Lisboa, apontam-se as seguintes:
AJUDA DE BERÇO ( da qual sou associado há vários anos)
PONTO DE APOIO À VIDA
CASA DE SANTA ISABEL
AJUDA DE MÃE
ASSOCIAÇÃO DE AJUDA AO RECÉM-NASCIDO
É claro que esta preciosa ajuda actua de modo algo silencioso para o comum do cidadão, e necessitaria de mais “publicidade”. Parece que aos defensores do SIM (alguns deles pelo menos) escapa esta realidade.
Tudo isto se deverá ao facto de que o BEM actua sem grandes fanfarras, não lhe parece?
Um abraço (de outro católico).
Cabral-Mendes
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