domingo, janeiro 07, 2007

TODOS TÊM DIREITO À HABITAÇÃO

O direito de todos à habitação está de novo na ordem do dia por força das recentes lutas sociais em França lideradas pela associação Les Enfants de Don Quichotte (Filhos de D. Quixote) que levaram o Presidente Jacques Chirac a pedir ao governo para avançar na efectivação de “droit au logement opposable”, isto é, um direito à habitação que vincule o Estado.
Os Filhos de D. Quixote lançaram recentemente uma campanha distribuindo barracas com a sigla SDF (Sem Domicílio Fixo) por várias cidades francesas, nomeadamente, Paris. Centenas de pessoas instalaram-se nessas barracas há cerca de quinze dias ao longo do canal Saint Martin em Paris e conseguiram o seu objectivo levar as autoridades francesas a anunciar uma nova política pública de habitação. Em França, segundo a Fundação Abbé Pierre, vivem mal alojadas três milhões de pessoas
Chirac tomou algumas medidas como presidente da Câmara de Paris para garantir o direito à habitação e está confrontado com esta grave fractura social, quando se aproximam as eleições presidenciais e a candidata socialista Ségolène Royal, que está à frente nas sondagens, tem prometido «un logement pour chacun», uma casa para todos.
O projecto de lei anunciado pelo primeiro-ministro francês, M. de Villepin, no passado dia 3 de Janeiro, tem como primeiros destinatários as populações mais vulneráveis e deverá ser alargado depois de 2012 a todas as pessoas que vivem em condições insalubres e indignas. O projecto implica a clarificação das responsabilidades respectivas do Estado e das autarquias locais nesta matéria.
Vale a pena seguir o debate que a consagração deste direito à habitação “opposable”, um direito que vincule o Estado, não deixará de suscitar em França.
A Constituição da República Portuguesa estabelece no artigo 65.º que: «Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de uma dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar». Sabemos que este direito social, implica obrigações positivas do Estado, justifica e legitima a pretensão do cidadão a determinadas prestações, está longe de estar universalmente assegurado.
Não podemos deixar de referir a importância que tiveram políticas públicas de habitação como o Programa PER, prolongado pelo PER Famílias, no assegurar do direito à habitação de muitos milhares de cidadãos que viviam em barracas nas áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto. O Programa PER ainda não foi concluído nalguns concelhos e não permite responder a outras graves carências de habitação de pessoas que não foram abrangidas pelo respectivo recenseamento.
O PER foi aprovado na sequência de lutas sociais em torno dos desalojados de Camarate e da Quinta da Serra, e pese embora a avaliação diferenciada das suas realizações, permitiu resolver alguns problemas dramáticos como era a Quinta do Mocho ou o Casal Ventoso.
Este programa teve o grande mérito de se destinar a todos os cidadãos, não distinguindo entre nacionais e imigrantes. Este é um ensinamento que não pode ser perdido.
A efectivação do direito à habitação deve motivar o interesse e a participação de todos os cidadãos. A carência de habitação repercute-se no estatuto social, nas condições de acesso ao emprego, na produtividade do trabalho, nas oportunidades de saúde, de instrução, de cultura e participação social, como já defendia em 1988 Manuela Silva, «A pobreza urbana - O avesso da cidade», in Povos e Culturas, n.º3, edição da Universidade Católica Portuguesa.
Vale a pena estar atento às questões que têm sido levantadas pela “Plataforma artigo 65 - Habitação para tod@s”. Estou certo que as boas notícias que nos vêm de França nesta matéria não deixarão de encontrar eco neste movimento e suscitar novas iniciativas.
Considero que o governo deverá definir novas políticas públicas de habitação, que contribuam para efectivar o direito de todos à habitação, a que a República Portuguesa se auto-vinculou na Constituição.

1 comentário:

CLeone disse...

Caro José Leitão
Estou a organizar um livro homenagem a Mário Sottomayor Cardia e, com o apoio da viúva e da editora, gostava de contar com a sua participação, com um texto como o que escreveu aqui. Se estiver interessado em saber mais, pf escreve-me da sua caixa pessoal para esplanar@hotmail.com e eu responder-lhe-ei da minha morada pessoal. Espero ter notícias suas em breve.
Carlos Leone