domingo, janeiro 21, 2007

MEMÓRIAS DE EDMUNDO PEDRO

A apresentação do primeiro volume das “Memórias - Um Combate pela Liberdade” de Edmundo Pedro, no passado dia 18 de Janeiro, 73 anos depois da greve revolucionária de 18 de Janeiro de 1934. A preparação dessa greve levou-o à prisão com quinze anos de idade, tendo sido condenado a um ano de prisão e à perda de direitos políticos por cinco anos.
O livro editado pela Âncora, foi apresentado por Pacheco Pereira, na Torre do Tombo. Na mesa estiveram presentes: o Presidente da Assembleia da República, Jaime Gama, o Secretário de Estado da Cultura, Mário Vieira de Carvalho, Manuel Alegre, o director da Torre do Tombo, Silvestre Lacerda, além do editor, Baptista Lopes.
Este livro, muito bem escrito, é um documento incontornável sobre a luta de uma geração de militantes operários para quem o comunismo aparecia nos anos trinta do século XX como a concretização das suas aspirações a uma sociedade de justiça e democracia, uma sociedade sem discriminações. Edmundo Pedro pertence à geração de muitos milhares, talvez milhões, de jovens que enfrentaram nessa época em todo o mundo, os pelotões de fuzilamento, a forca, o cutelo ou «foram lançados, servindo de combustível, nas fornalhas dos comboios militares de Chiang Kai Chek». Muitos felizmente, como Edmundo Pedro, viveram o tempo suficiente para perceber como a ruptura do leninismo com as tradições democráticas do movimento operário levaram à traição dos ideais libertadores que os animavam.
Nada disto retira grandeza à luta generosa da geração de dirigentes operários do PCP, que procederam à reorganização do PCP em 1929, como Bento Gonçalves, Francisco Paula de Oliveira (Pavel), José de Sousa e dos que a continuaram.
Nada disto torna menos odiosa a repressão violenta de que foram vítimas por parte do salazarismo. Edmundo Pedro, como muitos outros comunistas, anarco-sindicalistas e mais tarde militantes anti-coloniais experimentaram no campo de concentração do Tarrafal a mais brutal e desumana repressão e se alguns saíram dali vivos isso deve-se ao facto do nazi-fascismo ter saído derrotado da segunda guerra mundial. É um dado a ter presente quando se pretende branquear os crimes do salazarismo.
Edmundo Pedro só saiu do campo de concentração do Tarrafal depois de terminada a segunda guerra mundial, com vinte e sete anos e tuberculoso. Fora para lá deportado no início de 1936, com apenas 17 anos.
O seu testemunho sobre o Tarrafal é, aliás, uma parte essencial deste livro, o que se compreende por que nele passou os anos decisivos da sua juventude, ao lado de seu pai, mas também de destacados militantes comunistas e anarco-sindicalistas. Permite-nos também conhecer melhor o regime prisional, as punições a que os presos políticos ali encarcerados estavam sujeitos, as tentativas de fuga, os espancamentos, as torturas cruéis, entre as quais, a frigideira.
O livro de Edmundo Pedro reconstitui ambientes e pessoas tornando-os vivos e presentes. É uma escrita com vocação para a transposição para o cinema. Estou certo que a partir dele se faria um bom guião para um filme.
O livro para além dos acontecimentos em que Edmundo Pedro esteve envolvido e da saga de seus pais e irmãos, uma família dizimada pela repressão salazarista, dá-nos elementos para conhecer o percurso de resistentes de personalidades como Álvaro Cunhal, Mário Castelhano, Júlio Fogaça, Álvaro Salema, Carolina Loff, entre muitos outros.
Conta com um prefácio de Mário Soares que o convidou a ingressar no Partido Socialista e de um posfácio, no qual Fernando Rosas evoca o que apreendeu com ele durante um período em que ambos estiveram presos no Reduto Sul do Forte de Caxias.
Como, justamente, refere Mário Soares é um livro «não só político, mas muito humano».
É impressionante o relato que faz do trabalho no Arsenal e da acção de Bento Gonçalves não só como político, mas também como operário altamente qualificado e empreendedor. Ajuda-nos a ter uma visão mais completa da época e das mentalidades a forma como vai referindo a sua educação sentimental. Dá pistas para estudar e rever a história deste período, a acção dos comunistas, dos anarco-sindicalistas, bem como, as tentativas de José de Sousa depois da ruptura com o PCP, para reorganizar o velho Partido Socialista.
Não é por isso possível tentar fazer a história deste período sem ter em conta este primeiro livro de “ Memórias” de Edmundo Pedro, leitura imprescindível para os que querem conhecer melhor as lutas democráticas que antecederam o 25 de Abril.

Sem comentários: