domingo, maio 15, 2005

LISBOA - ORGANIZAR A SOLIDARIEDADE

Lisboa é uma cidade marcada pela desigualdade de oportunidades, pela pobreza e pela exclusão social de um número crescente dos seus habitantes.
É desde logo uma cidade de contrastes intoleráveis. O índice do poder de compra é mais do que o dobro da média nacional e 2/3 superior ao da Região de Lisboa, porém um número elevado dos seus cidadãos vive sem ter condições para ver satisfeitas as suas necessidades mais básicas.
Manuel Maria Carrilho, na sua construção de um projecto alternativo para a governação da cidade, deu por isso, naturalmente, um papel de relevo à necessidade de pensar a intolerável situação existente para desenhar políticas que permitam construir uma Lisboa solidária. Tendo tido oportunidade de contribuir com algumas reflexões para uma das várias sessões que Manuel Maria Carrilho tem organizado e que envolvem mais de meio milhar de participantes, aqui deixo um breve resumo das preocupações que tenho manifestado sobre o papel dos municípios na criação de condições que assegurem a todos os seus residentes a inclusão e a cidadania.
O número de pessoas vítimas da pobreza e de diferentes formas de exclusão tem vindo a aumentar com o desemprego e a precaridade das relações de trabalho.
As pessoas com que nos cruzamos nas ruas são apenas a parte visível do icebergue da pobreza e da exclusão, que esconde milhares e milhares de pessoas a viver muito mal, idosos, crianças e mulheres que se encontram por de trás das janelas em habitações degradadas. Não podemos aceitar que assim continue a ser.
Queremos uma cidade que respeite todos os seus habitantes, que seja coesa e solidária, que inclua os excluídos. A governação de Lisboa tem de desenvolver políticas de inclusão dos grupos mais vulneráveis como os idosos, os imigrantes, os sem abrigo, os que vivem da prostituição e da mendicidade, não descurando respostas para as situações de pobreza tradicional.
Não ignoramos, a importância da solidariedade individual e consideramos imprescindível a acção das organizações não-governamentais, das inúmeras associações e instituições de solidariedade social, que se ocupam de cidadãos vítimas de alguns dos novos e velhos riscos sociais, mas nada substitui a responsabilidade da governação de Lisboa nesta matéria.
Na cidade existem milhares de associações do mais diverso tipo registadas no Governo Civil, muitas das quais prosseguem finalidades sociais relevantes, porventura sobrepostas e concorrentes, mas o cidadão que carece de apoio ignora a maior parte das vezes a quem se dirigir.
Uma nova atitude a nível da governação municipal que tenha por ambição contribuir para criar uma Lisboa solidária tem de fazer mais do que manter os programas que foram sendo criados pelas diferentes gestões municipais.
Tem desde logo de proceder a um Diagnóstico Social participado, procedendo a uma identificação quantitativa e qualitativa dos diferentes riscos sociais, identificando as áreas geográficas de maior incidência. Nesta matéria não se pode prescindir nem da colaboração das universidades, nem da dos militantes sociais empenhados no combate a muitos destes riscos sociais, quer para elaborar o diagnóstico, quer para dar resposta aos problemas identificados através da realização de Planos de Desenvolvimento Social a nível concelhio.
Uma das preocupações de uma nova governação de Lisboa terá de ser fomentar uma cobertura racional e equitativa de equipamentos sociais e serviços. Isso só será possível se a Câmara Municipal sob a liderança do seu Presidente promover a criação de uma verdadeira Rede Social, que permita a actuação voluntariamente concertada entre a Câmara e, nomeadamente, as grandes instituições existentes a nível da cidade, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, a Caritas Diocesana, os Centros Paroquiais e a Cruz Vermelha Portuguesa.
Nada disto exclui a colaboração e o apoio diversificado que a Câmara Municipal, directamente ou em colaboração com as Juntas de Freguesia, pode e deve dar às diferentes associações, como, por exemplo, as associações de imigrantes.
A Câmara deve, além disso, exprimir efectivamente a prioridade que atribui à solidariedade, através da orçamentação dos recursos adequados e tornando mais transparente qual é o orçamento da solidariedade.
A Câmara Municipal para ser eficaz na construção de uma Lisboa solidária terá também de se articular melhor com o Governo e com os organismos da administração central instalados na sua área. Não faz sentido que venha a ser implantado qualquer novo equipamento social por iniciativa do Governo sem que haja sobre essa matéria uma prévia concertação com o município.
As políticas sociais a prosseguir pelo município têm de tornar possível detectar e promover os encaminhamentos adequados às situações e problemas dos indivíduos, o que nem sempre é fácil.
Muitos de nós têm a experiência de que há soluções que não funcionam quando temos situações de pessoas em concreto para resolver, por inadequada e pouco clara repartição de competências entre as diversas instituições, gerando-se autênticos jogos de empurra em que ninguém assume a responsabilidade pela resolução do problema.
Mas promover o encaminhamento adequado é também ter como critério na escolha das respostas que se deve privilegiar aquelas que garantam mais autonomia pessoal e empenhamento dos cidadãos na ultrapassagem das situações de vulnerabilidade, pobreza ou de exclusão em que se encontram.

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