domingo, maio 07, 2006

O 1º DE MAIO - "DIA SEM IMIGRANTES" NOS EUA


O 1º de Maio de 2006 foi assinalado em grande número de países por demonstrações mais ou menos significativas de luta pelos direitos dos trabalhadores, que mais do que nunca precisam de estar unidos num mundo marcado pelos efeitos da globalização sobre as condições de trabalho, pela desregulamentação e pela precarização das relações laborais.
O que foi novo e surpreendeu pelo seu ineditismo foi, contudo, a greve dos imigrantes em situação irregular nos Estados Unidos da América, greve ao trabalho, à escola, às compras e às vendas. Este é um acontecimento que irá marcar a história presente e futura dos Estados Unidos. A forma como evoluir a situação terá repercussões a nível, não apenas dos EUA, mas também a nível mundial. Espanta-me por isso a limitada atenção que mereceu na imprensa portuguesa, em que muitas questões menores ligadas aos fenómenos migratórios têm por vezes tanto destaque.
Também me surpreende que a presença em Portugal daquele que é provavelmente o mais importante sociólogo das migrações da actualidade, o americano de origem cubana, Alejandro Portes, que apresentou na Fundação Luso-Americana, um novo livro em Português, intitulado «Estudos Sobre as Migrações Contemporâneas, Transnacionalismo, empreendedorismo e a segunda geração», edição Fim do Século, numa cuidada tradução de Frederico Ágoas, revista com rigor por Margarida Marques, só tenha merecido a atenção da Rádio Renascença,
A greve dos imigrantes em situação irregular nos EUA é um facto muito significativo porque mostra até que ponto propostas de radicalização do combate à imigração em situação irregular, incluindo a sua criminalização, está a conduzir ao desespero, à luta e a conflitos nas ruas por parte de cidadãos pacíficos que tendem a adoptar uma estratégia de invisibilização social.
Tendo colocado a questão a Alejandro Portes, na apresentação do seu livro, sobre o que irá acontecer, retivémos a ideia de que tudo vai depender da legislação que o Senado vier a aprovar. Uma legislação radical como é defendida pela direita radical norte-americana só conduziria ao confronto e ao agravar da situação. Estas propostas não têm uma racionalidade económica e estão relacionadas com algumas manifestações de intelectuais da direita americana, quanto ao peso dos hispânicos na sociedade americana. Recordemos o recente livro de Samuel Huntington, «Who Are We?», no qual considera que os afro-americanos já são americanos, mas os hispânicos não têm condições para vir a ser americanos.
Ora são cerca de 11 milhões o número de imigrantes em situação irregular nos EUA, na sua maioria hispânicos, sendo 6 milhões mexicanos. Muitos destes imigrantes são jovens que crescem indocumentados com as graves consequências que tudo isso tem para a sua integração na sociedade americana. Ocupam lugares nos sectores de serviços, agricultura e construções, essenciais para o funcionamento da economia e da sociedade americana. Talvez seja por isso que a direita inteligente, de que é expressão o Wall Street Journal, muitos deputados e senadores, republicanos e democratas, bem como académicos liberais, se demarcam das propostas da direita radical, que são anti-económicas e desrespeitadoras dos direitos dos imigrantes, e procuram outros caminhos para a regulação dos fluxos migratórios para os EUA. Há três máximas da experiência que convêm reter: a regulação dos fluxos migratórios tem de partir da análise concreta da situação existente e não de algumas ideias fixas definidas à priori; não vale a pena criar obstáculos à imigração legal quando os agentes económicos consideram necessário contratar imigrantes, sob pena de se estimular a imigração ilegal; a criminalização dos imigrantes em situação irregular não é solução para o combate a esse tipo de imigração, só contribui para gerar tensões sociais evitáveis.

PS. Nesta semana há que saudar a presidente da Câmara de Vila de Rei, Inês Barata. Não sei porque partido foi eleita, nem me interessa. Depois de um ano que destruiu a maior parte do património florestal do seu concelho, não se resignou ao abandono e ao avanço da desertificação. Promoveu a vinda legal de famílias imigrantes do Brasil para repovoar terras sem gente que os incêndios devastaram. Estas famílias vieram de Maringá , cidade que está geminada com Vila de Rei, e para a qual entre 1940 e 50 foi intensa a imigração portuguesa. Sejam bem vindos. Espero que esta iniciativa seja bem sucedida, e que a imigração de um país lusófono venha a ser considerada por outros municípios com problemas idênticos.
Uma última nota: O Público titulava no passado dia 4 de Maio de 2006 na primeira página «Imigrantes legais já são quatro por cento da população portuguesa». O "Já" é manifestamente dispensável.
Temos que perceber entrámos na era das migrações a nível mundial, e que nem a nossa economia, nem a nossa segurança social são sustentáveis sem o aumento da imigração legal.

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