domingo, fevereiro 08, 2009

NÃO À XENOFOBIA, SIM AOS DIREITOS HUMANOS

A crise, para além da destruição de empregos que acarreta, o que põe em causa o direito ao trabalho de muitos cidadãos, serve também de pretexto para despedimentos injustificados, causando mais desemprego, ansiedade e mal-estar.
A crise é um contexto fértil para todas as manipulações, para tudo o que contribui, parafraseando um verso de Sophia de Mello Breyner Andresen, para tornar as almas mais pequenas, ou mais cruamente para todas as derivas populistas, que procuram fazer avançar a sua agenda racista e xenófoba, ou se resignam a ela por falta de iniciativa política e social.
É nos momentos de crise que se torna ainda mais grave transigir sobre os princípios democráticos e que temos de nos bater como cidadãos pelos direitos de todos, nacionais ou estrangeiros.
Os recentes protestos e greves selvagens contra a contratação de estrangeiros, emigrantes portugueses e italianos, em dezenas de refinarias de petróleo, terminais de gás e centrais eléctricas, são um sinal grave, que não teve a resposta rápida e firme que era de exigir do governo britânico e dos poderosos sindicatos britânicos.
O ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, afirmou, de imediato: “Essa tentativa de discriminação é absolutamente inaceitável para o governo português”.
Acrescentou: “Queremos enfatizar a absoluta responsabilidade que os governos têm de assumir de evitar uma deriva proteccionista, xenófoba, nacionalista, que, se não for travada muito rapidamente por iniciativas muito fortes dos governos, nos pode arrastar para uma crise ainda maior”.
O princípio “british jobs for british workers” não é apenas é criticável porque as vítimas são, neste caso, trabalhadores comunitários, portugueses e italianos, violando por isso frontalmente a legislação comunitária. Temos também de rejeitar a discriminação em razão da nacionalidade na contratação de qualquer trabalhador, que se encontre legalmente num país. A invocação de uma preferência nacional ou comunitária na contratação de trabalhadores, legalmente residentes, para justificar uma discriminação em razão da nacionalidade, tem de ser considerada como uma forma de discriminação racial, como prevê a legislação portuguesa.
Da Itália de Berlusconi, só vêm más notícias e maus exemplos em matéria de imigração e direitos humanos. A Itália tornou-se um país incapaz de gerir os fluxos migratórios, mas a opção não pode ser pôr em causa a dignidade e os direitos humanos mais elementares dos imigrantes. A recente aprovação pela maioria do Senado italiano, com o voto favorável de 156 senadores da coligação de Berlusconi, de uma emenda às leis de segurança interna para que os médicos denunciem os imigrantes ilegais que acorrem aos serviços de saúde representa a ultrapassagem de um limiar intolerável.
È uma lei que rasga os princípios deontológicos da ética médica, brutalmente desumana e estúpida, que aplica a todos os imigrantes ilegais, incluindo às mulheres que, como referiu a senadora Anna Finocchiaro, do Partido Democrático, “vão deixar de ir aos hospitais para dar à luz ou para que os seus filhos sejam tratados” (Público, 6 de Fevereiro, de 2009). Os imigrantes “vão preferir a morte `à expulsão” avisou Jean-Leonard Touadi, único deputado negro italiano, nascido no Congo.
Estes sinais evidenciam que os valores e os direitos humanos nunca estão garantidos de forma irreversível em qualquer país, que a barbárie, a regressão política e histórica são sempre possíveis se a inércia dos democratas o permitir.
A batalha contra estas medidas, discursos e atitudes, não é exclusiva de ninguém. Tudo isto faz emergir novas linhas de clivagens, que não recobrem sempre as naturais divisões entre esquerda e direita. As novas lutas pela qualidade da democracia exige novas convergências entre todos os democratas, sejam laicos, cristãos ou de outras confissões religiosas, na defesa dos direitos humanos de todos.
Temos que recusar, por exemplo, que o exercício dos direitos humanos básicos e fundamentais, como é o direito à saúde, possa ser subordinados a qualquer condição de estatuto legal, preferência nacional, ou comunitária.
Para vencer a crise económica não são suficientes respostas económicas, é preciso fazê-las acompanhar de maior coesão social, do respeito intransigente pela dignidade e pelos direitos humanos de todos.

1 comentário:

bubacar disse...

Caro amigo!
o artigo é oportuno e sobretudo corajoso, nesta conjuntura mundial em que cresce onda de desemprego.Mais grave é os responsáveis não estarem à altua!

Abaços

Bubacar Djaló