O Livro Branco das Relações Laborais (LBRL), que pode ler aqui, é «o trabalho mais profundo feito em Portugal sobre o mundo do trabalho», como escreveram Isabel Vicente e Nicolau Santos, em “O fim dos mitos laborais”, no Expresso, de 22-12-2007. Podemos e devemos formular críticas e manifestar discordâncias, mas não podemos ignorá-lo na análise prospectiva do futuro. Admitindo que terei de voltar a ele, quero deixar algumas notas resultantes de uma primeira leitura.
O LBRL tem o grande mérito de ser um contributo fundamental para avaliar a forma como em concreto se processam as relações laborais, desfazendo alguns mitos a esse respeito, como se sublinha no já referido artigo, mas formula além disso um conjunto de propostas de alteração ao Código de Trabalho (CT), que terão de ser analisadas e discutidas.
Considero que é positiva a alteração proposta para o art. 4.º do CT. Mantém a possibilidade das normas legais reguladoras dos contratos de trabalho poderem ser afastadas por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, salvo quando delas resultar o contrário. Acrescenta, porém, que as normas relativas a um amplo conjunto de matérias só podem ser afastadas por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho em sentido mais favorável aos trabalhadores. As normas legais reguladoras dos contratos de trabalho só podem ser afastadas por contrato individual quando este estabeleça condições mais favoráveis para o trabalhador e se delas não resultar o contrário. Estas normas são completadas com a proposta de nova redacção para o art. 531.º no sentido de que as disposições dos instrumentos de regulamentação colectiva do trabalho só podem ser afastadas por contrato de trabalho quando este estabeleça condições mais favoráveis para o trabalhador.
Uma alteração positiva foi a de consagrar o limite de três anos para os contratos de trabalho a termo certo, impossibilitando que possam atingir seis anos, como acontecia actualmente, de acordo com o previsto no n.º 2 do art. 139.º do CT.
Um aspecto central do LBRL que merece uma análise crítica mais detalhada é o conjunto de propostas relativas à temática da flexibilidade interna, que abrange as matérias referentes ao tempo de trabalho, à mobilidade funcional e geográfica, em que se pretende deixar uma grande margem de intervenção à contratação colectiva e ao contrato individual de trabalho.
Em matéria de flexibilidade externa, o LBRL, procura flexibilizar respeitando a proibição constitucional de despedimento sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos. As propostas que formula para a simplificação dos procedimentos em matéria de despedimento com invocação de justa causa, com novas regras relativas à acção de impugnação do despedimento, devem ser seriamente ponderadas. Em matéria de extinção do posto de trabalho, o LBRL deveria procurar por termo à controvérsia jurisprudencial relativa à possibilidade e à forma de recurso ao procedimento cautelar de suspensão de despedimento.
O despedimento por inadaptação fica facilitado em termos que podem por em causa a segurança no emprego, se não houver cuidado na concretização das propostas formuladas.
Inúmeras são as questões que suscitam as propostas relativas ao direito colectivo do trabalho e as considerações relativas à representação dos trabalhadores, às reuniões de trabalhadores no local de trabalho e à questão da representatividade associativa, que será cada vez mais relevante no futuro.
Ao avaliar o conjunto das propostas do LBRL e a pretensão de criar um direito de trabalho mais flexível, que só terá sentido, se for um direito efectivamente aplicado e não meramente virtual como acontece hoje em grandes áreas de actividade, temos que ter em conta os constrangimentos concretos da realidade social.
A Comissão Nacional Justiça e Paz, descreveu-a no seu contributo para o LBRL, de forma objectiva: «No caso português, existem fortes condicionalismos a uma aplicação do conceito de flexisegurança, já que o Estado e o sistema de segurança social continuam a enfrentar graves restrições financeiras, a actividade económica não tem apresentado potencial para um ritmo crescente e suficiente de criação de emprego, os níveis de qualificação escolar e profissional de grande parte dos trabalhadores não lhes conferem uma empregabilidade facilitadora da mobilidade profissional, o contexto cultural é favorável a comportamentos arbitrários no exercício dos poderes hierárquicos e patronais”.
Estas são algumas notas breves suscitadas por uma primeira leitura do LBRL.
É inequívoco que se torna necessário o fortalecimento do movimento sindical, das centrais e dos sindicatos para fazer face aos novos desafios, o que passa nomeadamente pela concentração de meios e recursos.
O recente anúncio da criação da FEBASE, Federação do Sector Financeiro, que engloba os principais sindicatos da Banca e dos Seguros, é um passo na construção do movimento sindical do futuro que terá de ser cada vez mais forte e representativo para poder defender com eficácia os trabalhadores.
domingo, dezembro 30, 2007
terça-feira, dezembro 25, 2007
A ESPERANÇA CRISTÃ SEGUNDO BENTO XVI
A encíclica “Salvos Na Esperança” de Bento XVI foi recebida com muita discrição, sem grandes comentários na comunicação social. Penso, contudo, que é um documento importante, de grande densidade espiritual.
Tem sido referido criticamente que esta encíclica se dirige apenas aos católicos e não também a todos os homens de boa vontade, como aconteceu com outras no passado, ou que não cita, por exemplo, a Gaudium et Spes do Concílio Vaticano II. Tudo isso é verdade, mas não podemos deixar de estar atentos ao que tem de profundamente inovador.
Tem-se sido dito que a encíclica é muito europeia, mas não o é mais do que anteriores documentos e percebe-se que Bento XVI, tem a preocupação de alargar os seus horizontes. É significativo da importância que dá à Africa e à Ásia, o destaque dado ao exemplo de uma santa sudanesa, Josefina Bakhita (nascida por volta de 1869), ao mártir vietnamita Paulo Le-Bao-Thin (falecido em 1987) ou o «inesquecível» cardeal Nguyen Van Thun que nos deixou nas suas palavras “um livrinho precioso: «Orações de Esperança»”. É uma encíclica europeia na medida em que tem presente a narrativa da modernidade e os desafios que a Revolução Francesa e a Revolução Russa colocaram à existência cristã, mas, se é certo que há mais mundos para lá destes processos históricos, não podemos ignorar os impactos universais que daí decorreram. Engels, Marx ou Lenine, que refere, tiveram e têm influência nos processos políticos em vários continentes.
É interessante verificar que partindo do judaísmo antigo, de São Paulo e de Padres da Igreja como Santo Agostinho, São Gregório Nazianzeno, São Máximo o Confessor, São Tomás de Aquino - embora apenas para o contrapor a Lutero sobre a exegese da Carta Aos Hebreus-, cite, entre outros, Francis Bacon, Henri de Lubac, Emmanuel Kant, “Os Irmãos Karamazov” de Dostoievski, Platão, os marxistas da Escola de Frankfurt, Teodoro W. Adorno e Max Horkheimer, muitas vezes o Catecismo da Igreja Católica, mas não os ilustres predecessores, como é usual.
Também não é habitual a citação, mesmo crítica, de pensadores laicos como se faz nesta encíclica. Este facto não deve ser ignorado nem minimizado e é justo interpretá-lo como uma vontade de dialogar e argumentar, que deve ser a atitude da Igreja Católica nas modernas sociedades democráticas, no quadro do que pretende ser a necessidade de “uma autocrítica da idade moderna feita em diálogo com o cristianismo e a sua concepção de esperança”.
Um exercício interessante, mas para o qual não tenho competência seria ver em que medida algumas das reflexões, designadamente sobre o sofrimento, se aproximam, afastam ou ficam aquém de outras, como as do notável teólogo alemão J.Baptist Metz sobre o sofrimento.
A encíclica não pretende ser meramente “informativa”, mas também “performativa”, como ela própria refere, e nesta perspectiva há aspectos, que merecem uma leitura atenta e meditada. Refiro-me às considerações sobre esperança e salvação, que atravessam todo o documento, particularmente, sobre os “lugares” de aprendizagem e de exercício da esperança, que incluem: a oração como escola da esperança; agir e sofrer como lugares de aprendizagem da esperança; o Juízo como lugar de aprendizagem e de exercício da esperança.
É também de sublinhar a preocupação que tem em afirmar que a salvação nunca é apenas uma questão pessoal, que “as nossas vidas estão em profunda comunhão entre si”, que “continuamente entra na minha existência a vida dos outros: naquilo que penso, digo, faço e realizo”.
Bento XVI preocupa-se em afastar representações inadequadas sobre a “vida eterna” para nos iniciar na esperança cristã, que reconhece ser “uma expressão insuficiente, que cria confusão”.
A questão que se coloca e para a qual ainda não há resposta possível, é a de saber em que medida esta encíclica irá ser performativa, isto é, para a citar, “uma comunicação que gera factos e muda a vida”.
Apenas posso acrescentar que, no que me diz respeito, sinto que me desafia a lê-la e meditá-la muitas vezes, porque está centrada no essencial da vida.
Tem sido referido criticamente que esta encíclica se dirige apenas aos católicos e não também a todos os homens de boa vontade, como aconteceu com outras no passado, ou que não cita, por exemplo, a Gaudium et Spes do Concílio Vaticano II. Tudo isso é verdade, mas não podemos deixar de estar atentos ao que tem de profundamente inovador.
Tem-se sido dito que a encíclica é muito europeia, mas não o é mais do que anteriores documentos e percebe-se que Bento XVI, tem a preocupação de alargar os seus horizontes. É significativo da importância que dá à Africa e à Ásia, o destaque dado ao exemplo de uma santa sudanesa, Josefina Bakhita (nascida por volta de 1869), ao mártir vietnamita Paulo Le-Bao-Thin (falecido em 1987) ou o «inesquecível» cardeal Nguyen Van Thun que nos deixou nas suas palavras “um livrinho precioso: «Orações de Esperança»”. É uma encíclica europeia na medida em que tem presente a narrativa da modernidade e os desafios que a Revolução Francesa e a Revolução Russa colocaram à existência cristã, mas, se é certo que há mais mundos para lá destes processos históricos, não podemos ignorar os impactos universais que daí decorreram. Engels, Marx ou Lenine, que refere, tiveram e têm influência nos processos políticos em vários continentes.
É interessante verificar que partindo do judaísmo antigo, de São Paulo e de Padres da Igreja como Santo Agostinho, São Gregório Nazianzeno, São Máximo o Confessor, São Tomás de Aquino - embora apenas para o contrapor a Lutero sobre a exegese da Carta Aos Hebreus-, cite, entre outros, Francis Bacon, Henri de Lubac, Emmanuel Kant, “Os Irmãos Karamazov” de Dostoievski, Platão, os marxistas da Escola de Frankfurt, Teodoro W. Adorno e Max Horkheimer, muitas vezes o Catecismo da Igreja Católica, mas não os ilustres predecessores, como é usual.
Também não é habitual a citação, mesmo crítica, de pensadores laicos como se faz nesta encíclica. Este facto não deve ser ignorado nem minimizado e é justo interpretá-lo como uma vontade de dialogar e argumentar, que deve ser a atitude da Igreja Católica nas modernas sociedades democráticas, no quadro do que pretende ser a necessidade de “uma autocrítica da idade moderna feita em diálogo com o cristianismo e a sua concepção de esperança”.
Um exercício interessante, mas para o qual não tenho competência seria ver em que medida algumas das reflexões, designadamente sobre o sofrimento, se aproximam, afastam ou ficam aquém de outras, como as do notável teólogo alemão J.Baptist Metz sobre o sofrimento.
A encíclica não pretende ser meramente “informativa”, mas também “performativa”, como ela própria refere, e nesta perspectiva há aspectos, que merecem uma leitura atenta e meditada. Refiro-me às considerações sobre esperança e salvação, que atravessam todo o documento, particularmente, sobre os “lugares” de aprendizagem e de exercício da esperança, que incluem: a oração como escola da esperança; agir e sofrer como lugares de aprendizagem da esperança; o Juízo como lugar de aprendizagem e de exercício da esperança.
É também de sublinhar a preocupação que tem em afirmar que a salvação nunca é apenas uma questão pessoal, que “as nossas vidas estão em profunda comunhão entre si”, que “continuamente entra na minha existência a vida dos outros: naquilo que penso, digo, faço e realizo”.
Bento XVI preocupa-se em afastar representações inadequadas sobre a “vida eterna” para nos iniciar na esperança cristã, que reconhece ser “uma expressão insuficiente, que cria confusão”.
A questão que se coloca e para a qual ainda não há resposta possível, é a de saber em que medida esta encíclica irá ser performativa, isto é, para a citar, “uma comunicação que gera factos e muda a vida”.
Apenas posso acrescentar que, no que me diz respeito, sinto que me desafia a lê-la e meditá-la muitas vezes, porque está centrada no essencial da vida.
domingo, dezembro 16, 2007
A PRESIDÊNCIA PORTUGUESA DA UNIÃO EUROPEIA E O FUTURO
Ao terminar a Presidência Portuguesa da União Europeia, é com orgulho que constatamos que contribuiu efectivamente para o seu fortalecimento e, que a assinatura do Tratado de Lisboa é um marco positivo no processo de construção europeia. É justo acrescentar que Portugal também ficou mais forte.
O sucesso da Presidência não é apenas mérito de José Sócrates, é fruto de equipas vastas e em grande parte invisíveis, que ele soube coordenar, mas é justo elogiar o contributo dado pela equipa do Ministério dos Negócios Estrangeiros, o Ministro Luís Amado, os Secretários de Estado, João Gomes Cravinho e Manuel Lobo Antunes. O sucesso é também resultado do empenhamento e da competência demonstrada pela diplomacia portuguesa.
O que gostaria de sublinhar é que esta Presidência soube articular sabiamente a agenda europeia com a agenda portuguesa. A Cimeira com o Brasil, a aprovação da parceria especial entre Cabo Verde e a União Europeia, A Cimeira Europa-África correspondem a opções estratégicas da União Europeia, mas que se entrelaçam de forma muito positiva com prioridades da política externa portuguesa. Conjugar os interesses nacionais com os interesses europeus é um grande desafio para o futuro, num momento em que a União Europeia, depois do Tratado de Lisboa pretende ter, enquanto tal, um papel mais articulado a nível internacional. Temos que construir uma doutrina sobre esta matéria com realismo, mas sem deixar de considerar que Portugal, pela sua história e pelos laços que mantêm com o Mundo de Língua Portuguesa deverá ter uma política externa que os projecte no futuro e que não se resigne à sua demografia, criando também uma articulação mais dinâmica com as comunidades portuguesas na Europa e no Mundo. Só quem tiver este desígnio estratégico para Portugal, deve merecer o apoio dos cidadãos.
Não é portanto justo dizer que depois desta Presidência, José Sócrates está de regresso a Portugal sem fuga possível.
Agora o que é verdade é que temos tarefas muito exigentes para aproveitar o justificado impulso que esta Presidência trouxe para a “marca Portugal”. Foi oportuno lançar a campanha de promoção da “marca Portugal” no fim desta Presidência.
Não podemos ignorar que, como refere Alejandro Portes: «O novo espaço transnacional, marcado pela presença das cidades globais, é criado por fluxos sustentados de capital, tecnologia, informação … e pessoas» (vd, Estudos sobre as Migrações Contemporâneas; Fim de Século, Lisboa).
Temos muito por fazer em matéria de educação e formação, na nossa inserção mais consistente nas redes transnacionais de ciência, tecnologia e comunicações. Temos de ter, pelo menos uma cidade, Lisboa, como uma cidade global, que exerça as suas funções de capital no quadro nacional, mas que seja também um nódulo da economia-mundo globalizada, de que depende, em grande medida, o futuro de Portugal.
Tudo isto só é possível fazer com as pessoas, os portugueses e os imigrantes, que nos acrescentam, e são essenciais para Portugal vencer os desafios. É imprescindível uma Administração Pública que se sinta respeitada e seja motivada para se superar ao serviço de metas mais ambiciosas para o desenvolvimento do País.
Não devemos por isso perdermo-nos em polémicas estéreis, mas o Governo tem de demonstrar que depois de ter mostrado determinação, é capaz de continuar a decidir questões estratégias para o futuro em matéria de comunicações, como o TGV e o novo Aeroporto, mas, ao mesmo tempo, não ser autista face às críticas dos trabalhadores e sindicatos e desconfiar dos iluminados, que por pretenderem ter toda a razão, são incapazes de se sujeitar ao contraditório.
É fundamental para o futuro do País, que o Governo tenha êxito, o que só acontecerá de forma sustentável, se não for autista, se for forte face aos grandes interesses privados quando não convergem com o interesse nacional, e capaz de ser sensível às críticas justas dos trabalhadores.
O sucesso da Presidência não é apenas mérito de José Sócrates, é fruto de equipas vastas e em grande parte invisíveis, que ele soube coordenar, mas é justo elogiar o contributo dado pela equipa do Ministério dos Negócios Estrangeiros, o Ministro Luís Amado, os Secretários de Estado, João Gomes Cravinho e Manuel Lobo Antunes. O sucesso é também resultado do empenhamento e da competência demonstrada pela diplomacia portuguesa.
O que gostaria de sublinhar é que esta Presidência soube articular sabiamente a agenda europeia com a agenda portuguesa. A Cimeira com o Brasil, a aprovação da parceria especial entre Cabo Verde e a União Europeia, A Cimeira Europa-África correspondem a opções estratégicas da União Europeia, mas que se entrelaçam de forma muito positiva com prioridades da política externa portuguesa. Conjugar os interesses nacionais com os interesses europeus é um grande desafio para o futuro, num momento em que a União Europeia, depois do Tratado de Lisboa pretende ter, enquanto tal, um papel mais articulado a nível internacional. Temos que construir uma doutrina sobre esta matéria com realismo, mas sem deixar de considerar que Portugal, pela sua história e pelos laços que mantêm com o Mundo de Língua Portuguesa deverá ter uma política externa que os projecte no futuro e que não se resigne à sua demografia, criando também uma articulação mais dinâmica com as comunidades portuguesas na Europa e no Mundo. Só quem tiver este desígnio estratégico para Portugal, deve merecer o apoio dos cidadãos.
Não é portanto justo dizer que depois desta Presidência, José Sócrates está de regresso a Portugal sem fuga possível.
Agora o que é verdade é que temos tarefas muito exigentes para aproveitar o justificado impulso que esta Presidência trouxe para a “marca Portugal”. Foi oportuno lançar a campanha de promoção da “marca Portugal” no fim desta Presidência.
Não podemos ignorar que, como refere Alejandro Portes: «O novo espaço transnacional, marcado pela presença das cidades globais, é criado por fluxos sustentados de capital, tecnologia, informação … e pessoas» (vd, Estudos sobre as Migrações Contemporâneas; Fim de Século, Lisboa).
Temos muito por fazer em matéria de educação e formação, na nossa inserção mais consistente nas redes transnacionais de ciência, tecnologia e comunicações. Temos de ter, pelo menos uma cidade, Lisboa, como uma cidade global, que exerça as suas funções de capital no quadro nacional, mas que seja também um nódulo da economia-mundo globalizada, de que depende, em grande medida, o futuro de Portugal.
Tudo isto só é possível fazer com as pessoas, os portugueses e os imigrantes, que nos acrescentam, e são essenciais para Portugal vencer os desafios. É imprescindível uma Administração Pública que se sinta respeitada e seja motivada para se superar ao serviço de metas mais ambiciosas para o desenvolvimento do País.
Não devemos por isso perdermo-nos em polémicas estéreis, mas o Governo tem de demonstrar que depois de ter mostrado determinação, é capaz de continuar a decidir questões estratégias para o futuro em matéria de comunicações, como o TGV e o novo Aeroporto, mas, ao mesmo tempo, não ser autista face às críticas dos trabalhadores e sindicatos e desconfiar dos iluminados, que por pretenderem ter toda a razão, são incapazes de se sujeitar ao contraditório.
É fundamental para o futuro do País, que o Governo tenha êxito, o que só acontecerá de forma sustentável, se não for autista, se for forte face aos grandes interesses privados quando não convergem com o interesse nacional, e capaz de ser sensível às críticas justas dos trabalhadores.
domingo, dezembro 09, 2007
SOTTOMAYOR CARDIA - LIBERDADE SEM DOGMA
Vai ser apresentado publicamente no próximo dia 17, na Fundação Mário Soares, o livro “Liberdade sem Dogma” sobre Sottomayor Cardia, organizado por Carlos Leone e Manuela Rêgo.
Mário Sottomayor Cardia foi um cidadão, um intelectual e um político socialista que contribuiu decisivamente para que vivamos hoje numa democracia política e num Estado de Direito. A consolidação da democracia não foi o resultado de um confronto entre alguns líderes, foi um processo social e político em que participaram milhares e milhares de cidadãos, mas no qual se destacaram em diversos momentos, vários actores políticos.
Referimo-nos aqui à acção Mário Sottomayor Cardia na altura da sua morte, mas não queremos deixar de assinalar o interessante livro coordenado por Carlos Leone e Manuela Rêgo, que deveria ter sequência relativamente a outras figuras intelectuais e políticas que contribuíram para a concretização das promessas democratizadoras do 25 de Abril.
O livro é composto por documentos e estudos, embora essa divisão possa ser questionada. É interessante referir que a homenagem a Cardia começou na blogosfera, como testemunha Carlos Leone dando conta da recolha a que procedeu com Isabel Goulão, conhecida na blogosfera por Miss Pearls.
Contribuíram com testemunhos: Mário Cláudio, José Vargas Santos Pessegueiro, Gastão Cruz, Vasco Vieira de Almeida, António Reis, L. A. Costa Dias, Jorge Miranda, Maria Emília Melo, Mário Soares e José Medeiros Ferreira. Os estudos incluídos são das autoria de: Daniel Melo, Miguel Real, Manuel Filipe Canaveira, José Castelo, João Miguel Almeida; José Leitão e António Braz Teixeira: Carlos Leone assina uma cuidada introdução e Manuela Rêgo um exaustivo levantamento da bibliografia de Mário Sottomayor Cardia, instrumento de trabalho imprescindível para prosseguir o estudo da sua vida e obra.
Mário Sottomayor Cardia teve muitos momentos marcantes na sua actuação política, designadamente: na elaboração da primeira Declaração de Princípios e no primeiro Programa do Partido Socialista; na afirmação da autonomia estratégica do Partido Socialista; nas suas intervenções na Assembleia Constituinte, com destaque para a suas intervenções críticas contra o Documento-Guia da Aliança Povo-M.F.A., ou o I Pacto M.F.A.- Partidos (vd. Medeiros Ferreira); a sua responsabilidade na consagração da liberdade de ensino no n.2 do art. 4 da Constituição da República (vd. Jorge Miranda). Este facto terá influenciado, segundo me confidenciou, a sua escolha para Ministro da Educação, funções que viria a exercer com lucidez e determinação num período difícil. É também muito importante o seu contributo teórico para o Partido Socialista, com livros como: “Por Uma Democracia Anticapitalista (1973) ou “Socialismo sem Dogma” (1982).
Tomar posição é sempre correr o risco de entrar em divergência com os próprios companheiros de luta. Discordei muitas vezes de Mário Sottomayor Cardia relativamente, por exemplo, a candidatura presidencial de Jorge Sampaio, ou o Acordo Ortográfico, mas senti, como refere Jorge Miranda no seu texto e me foi testemunhado então por Eduardo Lourenço, que o Partido Socialista deveria ter estado mais presente aquando da sua morte.
Neste importante e interessante livro faltam vozes de outras áreas e outras gerações do Partido Socialista que deveriam estar presentes. Percebe-se da introdução, que houve colaborações que se não vieram a concretizar.
De sublinhar a importância de que se reveste a colaboração de jovens investigadores que não tendo sido seus companheiros de luta manifestam empenho em estudar o seu pensamento e acção, como Cristina Lisboa, Daniel Melo e João Miguel Almeida.
Este livro deixa muitas pistas abertas para futuras investigações como a que Manuela Rêgo não teve possibilidade de concretizar, sobre o que se escreveu sobre Sottomayor Cardia, enquanto Ministro da Educação.
domingo, dezembro 02, 2007
FINALMENTE O ACORDO ORTOGRÁFICO
É uma boa notícia saber que se começam finalmente a criar condições para que o Acordo Ortográfico venha a ser aplicado. É caso para saudarmos o facto de após tanta demissão e falta de visão estratégica, existirem estadistas capazes de levar para a frente um processo essencial para assegurar que a Língua Portuguesa seja, pelo menos, durante este século uma língua com projecção mundial, falada por milhões de pessoas em vários continentes.
Esta é uma questão que irá ser discutida nos próximos tempos e deixo já clara a minha posição. Este blogue que nunca escondeu o seu compromisso com a Língua Portuguesa e com o Mundo de Língua Portuguesa apoia, por isso mesmo, com determinação a aplicação do Acordo Ortográfico.
A Língua Portuguesa é hoje uma Língua falada por milhões de pessoas em vários continentes, é a língua de Portugal e do Brasil, a língua oficial de Cabo Verde, Guiné-Bissau, S. Tomé e Príncipe, Angola, Moçambique, uma das duas Línguas de Timor-Leste, a par do tétum.
A Língua Portuguesa é também a única língua do mundo ocidental com mais de uma ortografia. Este facto enfraquece a expansão da Língua Portuguesa no Mundo, dificulta a sua difusão através das novas tecnologias de informação e a tradução automática de qualidade de e para outras línguas.
A diversidade dos mundos de que é feito o Mundo da Língua Portuguesa terá na existência de regras ortográficas comuns um factor de enriquecimento na comunicação e no diálogo cultural. Se elas não vierem a ser aplicadas iremos assistir a um processo de fragmentação, que comprometerá dramaticamente o futuro da Língua Portuguesa.
Relativamente aos que de boa fé encaram com algum desconforto este processo quero desde já recordar o seguinte. A ortografia da Língua Portuguesa tem mudado profundamente. Não é necessário recuarmos às canções de amigo medievais, bastará ver como escrevia Fernando Pessoa e como nós escrevemos hoje. Libertámo-nos no século XX de utilizar duplas consoantes, ganharemos alguma eficácia no ensino da Língua Portuguesa no século XXI se nos libertarmos, por exemplo, das consoantes mudas.
O processo de simplificação ortográfica teve início por iniciativa unilateral de Portugal durante a primeira República Portuguesa, só depois o Brasil iniciou o processo de simplificação ortográfica. Estes dois movimentos tornaram necessária a celebração de um Acordo Ortográfico, que tem que abranger hoje todos os Estados de Língua Portuguesa.
Alguns manifestam surpresa por haver normas legais nesta matéria, mas a questão tem uma dupla resposta. Normas legais em matéria de língua existem noutros países como a França, por exemplo. Por outro lado, língua e política estiveram sempre ligadas. Sem as leis do Marquês de Pombal, a língua de Camões não se teria tornado uma língua de cultura com prejuízo do latim em Portugal. No Brasil foram também as leis do Marquês que impuseram a Língua Portuguesa como única língua, permitindo manter a unidade do Brasil. Não é por acaso que o Uruguai e o Paraguai para se autonomizarem do Brasil adoptaram o castelhano. Talvez por isso mesmo Getúlio Vargas combateu a utilização do italiano e do alemão no intuito de assegurar a unidade do Brasil.
Pretender fazer passar o Acordo Ortográfico como uma imposição imperial brasileira a Portugal, como faz Vasco Graça Moura, quando o acordo foi negociado por gramáticos e linguistas portugueses da maior qualidade e empenho no futuro da Língua Portuguesa, seria do domínio do ridículo, se não fosse mais uma manifestação da incapacidade de uma parte da inteligência portuguesa, em definir uma agenda que permita a Portugal ter um lugar no Mundo correspondente à sua história e não apenas à sua demografia.
Quero por isso felicitar o editorial do «Expresso», de 1 de Dezembro, intitulado precisamente, «Viva o Acordo Ortográfico». É bom que um grande meio de comunicação de massas assuma desta forma as suas responsabilidades no que se refere ao futuro da Língua Portuguesa.
Esperamos que a Assembleia da República e o Governo saibam também assumir as suas responsabilidades.
Esta é uma questão que irá ser discutida nos próximos tempos e deixo já clara a minha posição. Este blogue que nunca escondeu o seu compromisso com a Língua Portuguesa e com o Mundo de Língua Portuguesa apoia, por isso mesmo, com determinação a aplicação do Acordo Ortográfico.
A Língua Portuguesa é hoje uma Língua falada por milhões de pessoas em vários continentes, é a língua de Portugal e do Brasil, a língua oficial de Cabo Verde, Guiné-Bissau, S. Tomé e Príncipe, Angola, Moçambique, uma das duas Línguas de Timor-Leste, a par do tétum.
A Língua Portuguesa é também a única língua do mundo ocidental com mais de uma ortografia. Este facto enfraquece a expansão da Língua Portuguesa no Mundo, dificulta a sua difusão através das novas tecnologias de informação e a tradução automática de qualidade de e para outras línguas.
A diversidade dos mundos de que é feito o Mundo da Língua Portuguesa terá na existência de regras ortográficas comuns um factor de enriquecimento na comunicação e no diálogo cultural. Se elas não vierem a ser aplicadas iremos assistir a um processo de fragmentação, que comprometerá dramaticamente o futuro da Língua Portuguesa.
Relativamente aos que de boa fé encaram com algum desconforto este processo quero desde já recordar o seguinte. A ortografia da Língua Portuguesa tem mudado profundamente. Não é necessário recuarmos às canções de amigo medievais, bastará ver como escrevia Fernando Pessoa e como nós escrevemos hoje. Libertámo-nos no século XX de utilizar duplas consoantes, ganharemos alguma eficácia no ensino da Língua Portuguesa no século XXI se nos libertarmos, por exemplo, das consoantes mudas.
O processo de simplificação ortográfica teve início por iniciativa unilateral de Portugal durante a primeira República Portuguesa, só depois o Brasil iniciou o processo de simplificação ortográfica. Estes dois movimentos tornaram necessária a celebração de um Acordo Ortográfico, que tem que abranger hoje todos os Estados de Língua Portuguesa.
Alguns manifestam surpresa por haver normas legais nesta matéria, mas a questão tem uma dupla resposta. Normas legais em matéria de língua existem noutros países como a França, por exemplo. Por outro lado, língua e política estiveram sempre ligadas. Sem as leis do Marquês de Pombal, a língua de Camões não se teria tornado uma língua de cultura com prejuízo do latim em Portugal. No Brasil foram também as leis do Marquês que impuseram a Língua Portuguesa como única língua, permitindo manter a unidade do Brasil. Não é por acaso que o Uruguai e o Paraguai para se autonomizarem do Brasil adoptaram o castelhano. Talvez por isso mesmo Getúlio Vargas combateu a utilização do italiano e do alemão no intuito de assegurar a unidade do Brasil.
Pretender fazer passar o Acordo Ortográfico como uma imposição imperial brasileira a Portugal, como faz Vasco Graça Moura, quando o acordo foi negociado por gramáticos e linguistas portugueses da maior qualidade e empenho no futuro da Língua Portuguesa, seria do domínio do ridículo, se não fosse mais uma manifestação da incapacidade de uma parte da inteligência portuguesa, em definir uma agenda que permita a Portugal ter um lugar no Mundo correspondente à sua história e não apenas à sua demografia.
Quero por isso felicitar o editorial do «Expresso», de 1 de Dezembro, intitulado precisamente, «Viva o Acordo Ortográfico». É bom que um grande meio de comunicação de massas assuma desta forma as suas responsabilidades no que se refere ao futuro da Língua Portuguesa.
Esperamos que a Assembleia da República e o Governo saibam também assumir as suas responsabilidades.
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