domingo, março 12, 2006

IMIGRAÇÃO E DESENVOLVIMENTO

Ligar imigração e desenvolvimento é sem dúvida o objectivo estratégico a promover nas próximas décadas. É significativo o facto do Ministério da Administração Interna ter promovido na passada semana um Seminário sobre a nova política de imigração, intitulado precisamente “Imigração e Desenvolvimento”.
Estamos muito longe da “imigração zero” que era o objectivo proclamado por muitos decisores políticos até há cerca de dez anos.
Sabemos hoje que o zero de imigração legal, promovia uma massiva imigração irregular. A União Europeia foi assim levada a promover políticas reactivas centradas no combate à imigração irregular, enquanto vários estados por razões diversas promoveram diversas regularizações extraordinárias que no tempo e circunstâncias em que ocorreram foram inteiramente justificadas.
A União Europeia está hoje confrontada não apenas com o envelhecimento da população, o que em si traduz um elemento positivo, uma vida mais longa e em melhores condições, mas simultaneamente um elemento negativo, uma quebra demográfica acentuada Os dados recentemente divulgados pelo Eurostat (nº 3/2006) apontam para o envelhecimento e a diminuição da população, que as migrações só por si não conseguiram evitar. Esta situação terá um enorme impacto sobre o crescimento económico global, o funcionamento do mercado interno, a competitividade das empresas e a sustentabilidade dos sistemas de segurança social. Apesar da imigração não constituir só por si uma solução para o envelhecimento demográfico, como refere o Livro Verde da UE sobre a imigração económica (http://europa.eu.int/eur-/lex/lex/LexUriServ/site/en/com2004_0811en01.pdf) serão necessários cada vez mais fluxos de imigrantes para colmatar as necessidades do mercado de trabalho da UE e assegurar a prosperidade da Europa. Não podemos também ignorar que as principais regiões desenvolvidas do mundo já concorrem entre si para atraírem imigrantes. Vamos chegar a uma situação em que os imigrantes ponderarão se é para a União Europeia, ou concretamente para Portugal, que valerá a pena imigrar, ao mesmo tempo que os portugueses (e outros europeus) se interrogarão se não vale a pena emigrar. Teremos de ser uma terra de acolhimento competitiva, garantindo permanência legal estável com direitos equiparados aos dos nacionais.
Por tudo isto não podemos deixar de debater o Relatório da Comissão Mundial sobre as Migrações Internacionais, intitulado “As migrações num mundo interligado: Novas linhas de acção”, que foi editado em português e apresentado esta semana por iniciativa da Fundação Calouste Gulbenkian. Para além do Relatório, vale a pena consultar os dados disponíveis sobre esta matéria no sítio da Comissão na Internet (http://www.gcim.org/en/).
A governança nacional das migrações num mundo interligado não pode ignorar as necessidades de diálogo e cooperação a nível regional e mundial. Como refere este relatório “há agora uma maior consciência de que os benefícios económicos, sociais e culturais das migrações internacionais têm de ser mais eficazes, e que as consequências negativas dos movimentos transfronteiriços podem ser melhor resolvidos”.
É necessário caminhar no sentido de uma governança das migrações também a nível mundial.
Criar mecanismos que permitam a imigração legal é um desafio que está colocado à União Europeia e aos seus Estados-Membros.
As políticas, meramente, reactivas à imigração irregular têm de dar lugar a políticas pró-activas de promoção da imigração legal que contribuam para o desenvolvimento, quer dos Estados de acolhimento, quer dos Estados de origem. As mudanças são cada vez mais rápidas e complexas. Muitos Estados são simultaneamente Estados de origem e de acolhimento, como é o caso de Portugal. É também perfeitamente pensável que entre dois Estados se possam desenvolver fluxos migratórios recíprocos, correspondendo a diferentes necessidades de segmentos dos seus mercados de trabalho e a aspirações e qualificações diversificadas dos seus cidadãos. Está já na agenda política da UE promover a circulação de cérebros, em lugar da tradicional fuga de cérebros.
Temos todos, cidadãos, decisores políticos, académicos da Europa e da África, de evitar que continuem a morrer cinco imigrantes africanos por dia ao tentar chegar à Europa, que dois mil imigrantes morram por ano ao tentar atravessar o Mediterrâneo, como refere o Relatório das Nações Unidas.
Penso que devemos ser guiados por duas ideias simples: pôr termo ao imenso e evitável sofrimento que as migrações irregulares comportam; passar a integrar as migrações nas estratégias nacionais, regionais e mundiais para o desenvolvimento.

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