domingo, outubro 08, 2006

A ERA DAS METRÓPOLES COSMOPOLITAS

Dizia-se há alguns anos que estávamos na era das migrações, que elas se tinham tornado um elemento fundamental das sociedades contemporâneas. Hoje dizê-lo é insuficiente, é preciso acrescentar que as migrações mudaram profundamente as sociedades de acolhimento, e que a sua presença se inscreveu nos territórios, dando origem a grandes metrópoles cosmopolitas como Londres, Amesterdão, Paris ou Lisboa. Este processo está apenas no início. Torna-se necessário mobilizar investigadores, académicos, decisores, agentes políticos e imigrantes para desenhar políticas públicas mais eficazes, que permitam uma integração de qualidade, potenciar as oportunidades de desenvolvimento que estes processos comportam e prevenir efeitos perversos.
A recente realização em Lisboa da 11.ª Conferência METROPLIS, subordinada ao tema “Paths & Crossroads: Moving People, Changing Places” entre 2 e 6 de Outubro de 2006, foi um acontecimento de enorme relevância para o aprofundamento das redes internacionais de reflexão e estudo sobre as migrações internacionais. O programa e a qualidade dos intervenientes, quer nas sessões plenárias, quer nos workshops, e a diversidade das abordagens, como se pode ver no programa aqui, dizem-nos bem da relevância deste acontecimento. Continuo a pensar que, como afirmei no seminário Metropolis International Workshop, realizado em Lisboa, em 28 e 29 de Setembro de 1998, que está publicado pela Fundação Luso-Americana, “as migrações nos obrigam a recordar que somos todos parte da mesma família humana, e que devemos agir uns para com os outros em espírito de fraternidade” (Migration forces uses to remember that since we are all part of the same human family, part of humankind as a whole, we must act in spirit of brotherhood toward each other).
É impossível resumir a riqueza das diversas contribuições. Espero que venham a ser disponibilizados na Rede e em suporte papel.
Gostaria de me congratular desde já pelo facto de a CPLP ter sido objecto de debate (A Lusophone Community: Multicional Alliances; Multiplice Belongings) e pelo facto de vários participantes estrangeiros me terem manifestado uma apreciação positiva do que tem sido realizado em Portugal em matéria de integração desde há uma década.
Alguns colocaram, contudo, uma questão que vale a pena aprofundar, em que medida o facto da maioria dos imigrantes serem provenientes de países de Língua Oficial Portuguesa, tem contribuído para atenuar algumas deficiências das nossas políticas de integração, isto é, se não fossem imigrantes lusófonos os resultados da integração seriam mais limitados. Creio que é uma questão que é possível trabalhar cientificamente. Num workshop em que participei, dedicado às segundas gerações post-coloniais foi apresentada uma interessante comunicação de Mies van Niekerk., intitulada “Post-Colonial Migration and the Second Generation, the Caribbeans in Netherlands”, na qual comprovou que os filhos de imigrantes das Caraíbas, mais concretamente, do Suriname e das Antilhas Holandesas, beneficiaram de um leque alargado de direitos, são cidadãos holandeses, têm um domínio da língua e da cultura holandesa, e inclusive do reconhecimento por parte dos holandeses de que “são como eles”, pelo que têm maiores níveis de sucesso escolar e profissional do que os filhos dos restantes de imigrantes. Esta é uma área de investigação que se afigura interessante e foi muito positivo que a Prof.ª Doutora Margarida Marques, da Universidade Nova de Lisboa, tenha dedicado um workshop às “Post-Colonial Second Generatin in Europe”.
Naturalmente que há imenso trabalho por fazer para assegurar uma melhor qualidade da integração de todos os imigrantes, mas sobre isso tenho apresentado propostas em textos políticos de intervenção.
Hoje queria apenas fazer uma chamada de atenção para este encontro excelentemente organizado e que foi um dos maiores realizados a nível mundial sobre migrações. Manifesto, no entanto, o meu desejo de que no futuro seja assegurada a possibilidade de falar em português em todos os workshops, o que em Espanha se faz recorrendo a voluntários, recrutados entre estudantes universitários de línguas estrangeiras.
O sítio do ACIME disponibiliza aqui, os cinco exemplares do Metropolis Policy News, jornal diário em língua inglesa da Conferência, onde os que tiverem interesse podem ter mais informações sobre esta Conferência.

PS.1 - As Associações de Imigrantes têm contribuído para facilitar uma integração de qualidade dos imigrantes em Portugal e foram associadas desde a criação em 1996 do ACIME (Alto Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas), à definição e concretização das políticas públicas de integração. Uma das Associações que até hoje mais me impressionou pela preocupação com o apoio aos seus membros e o progresso da sua terra natal, foi a ANPRP - Associação dos Naturais do Pelundo - que conseguiu finalmente ter um espaço em Lisboa, na Rua Fernando de Gusmão, Zona 6 A, Lote 7-Loja A, Quinta da Torrinha, na Ameixoeira.
A ANPRP é uma das associações em que os seus membros, na sua maioria trabalhadores com modestos salários, mais contribuem com as suas quotas, permitindo que funcione como associação de socorros mútuos que apoia os associados e suas famílias perante diversas adversidades da vida, além de apoiar projectos de desenvolvimento em Pelundo.
As Associações têm sido muito marcadas pela qualidade humana dos seus fundadores e principais dirigentes.
Assisti um dia a uma sessão singular, na qual Malam Gomes, que tinha cessado as funções de presidente, transferia as suas funções para o novo presidente eleito. Malam Gomes prestou contas, por sua iniciativa, de tudo, entregou fichas de sócios, livros de contabilidade em dia, livros de cheques, extractos bancários e inclusive a pasta que tudo continha e, que, como explicou tinha sido comprada com dinheiro da Associação. Fez isto com uma total naturalidade na frente de toda a gente.
Associações como esta dão um contributo imprescindível não apenas para a integração dos imigrantes, mas para a qualidade da sociedade civil portuguesa.

2 comentários:

Marco Oliveira disse...

Estive recentemente em Londres e fiquei impressionado com a quantidade de problemas com a Comunidade Muçulmana que todos os dias são noticiados.

Este clima de tensão tão intenso apenas existe em relação ao muçulmanos (ou a algumas comunidades muçulmanas).

E a sensação que fica (pela leitura deessas notícias, editoriais e artigos de opinião) é que o fosso em redor da comunidade muçulmana se está a alargar.

José Leitão disse...

Os muçulmanos na Europa são uma realidade plural,no plano espiritual, social e cultural e na forma como se inserem nas democracias pluralistas europeias.São uma componente das sociedades e culturas europeis e não uma presença transitória. Os muçulmanos portugueses e outros muçulmanos residentes em Portugal têm mantido uma forte ligação com os restantes cidadãos, as outras comunidades religiosas e as instituições portuguese. Temos que procurar viver cada vez mais juntos, de forma solidária e sem discriminações.Temos todos, muçulmanos ou não-muçulmanos que aprender com o que de positivo ou negativo se verifica em outras sociedades europeias.A criação de fossos em redor de comunidades não é uma fatalidade.